Já imaginou ficar mais de uma semana em casa ou no trabalho sem acesso a sinal de telefone, ou internet? É isso que moradores da Cohab Tablada, em Pelotas, têm enfrentado desde a instalação de bloqueadores de sinal no Presídio Regional. O equipamento, que deveria impedir o uso de celulares dentro das celas, estaria interferindo na comunicação das famílias e dos comércios que ficam no entorno do prédio.
O problema começou entre terça e quarta-feira da semana anterior, quando técnicos instalaram e ligaram os novos bloqueadores. Desde então, segundo os relatos, moradores estão sem telefone fixo, sem chamadas de celular e com internet oscilando ou completamente indisponível. O problema vem afetando a rotina, a segurança e até a renda de quem trabalha na região.
A dona de casa Cloé Brockman, 72 anos, mora há duas décadas na avenida Cristóvão José dos Santos, em frente ao presídio. Ela conta que a falha começou logo após a instalação do equipamento. “Eles testaram no primeiro dia e até tinha sinal. Depois, acabou. Não consigo ligar para lugar nenhum. Tenho dois irmãos idosos no Fragata e não consigo falar com eles. Às vezes o WhatsApp entra, às vezes não”, conta.
Cloé relata que nem o telefone fixo funciona. A internet, segundo ela, está “muito lenta”, a ponto de impedir tarefas simples. O marido dela, Sérgio Medina, que trabalha em uma oficina, também está sem atendimento: clientes não conseguem telefonar nem efetuar pagamentos eletrônicos. “Quem não cometeu crime não tem internet; quem cometeu, talvez tenha”, ironiza a mulher.
Medina afirma que os bloqueadores foram ativados antes de todo o sistema estar instalado, o que ampliou o impacto sobre o bairro. “Eles colocam um aparelho, ligam, testam e só depois querem ajustar o perímetro. Está tudo errado.”
O vizinho do casal, Leandro Batista, 49 anos, também relata prejuízos. Sem internet, a casa ficou até sem televisão. E o comércio da esposa, parado. “Ninguém faz nada sem internet hoje. Estamos sendo prejudicados financeiramente. As máquinas não funcionam e os clientes não conseguem pagar”, relata.
Ele afirma que o bloqueio já se espalhou por várias quadras, não se limitando apenas à rua da unidade prisional: “Em um raio de 200 metros tem gente sem sinal. […] Estamos reféns dessa situação.” Moradores estudam um abaixo-assinado e já buscam advogado, orientados pela própria delegacia.
Sem telefone e sem internet, além de não conseguir trabalhar, Homero Queiroga, o primeiro a procurar o jornal, teme por emergências. Trabalhando em escala 12×36 e cuidando dos pais idosos – o pai em início de Alzheimer –, Homero diz que precisa manter contato com a mãe enquanto está no serviço, mas as ligações simplesmente não completam. “Ficamos incomunicáveis por algo que não é culpa nossa”, resume.
Resposta do Estado
A reportagem questionou a Secretaria de Serviços Penais e Socioeducativos do Rio Grande do Sul, responsável pelo presídio e pelos bloqueadores. Em nota, a Polícia Penal informou que a instalação dos bloqueadores “segue rigorosamente as normas definidas pela ANATEL e é acompanhada diariamente pelo órgão fiscalizador, pelas operadoras de telefonia e pela equipe técnica responsável pelo contrato”.
O órgão acrescenta que, até o momento, não recebeu nenhuma formalização de interferência registrada pelas operadoras ou pelos canais oficiais de atendimento ao usuário. Ainda destaca que a instalação dos equipamentos no Presídio de Pelotas continua em fase de testes e ajustes, etapa na qual são realizadas medições técnicas, calibrações e certificações para evitar impactos externos.
A nota finaliza: “Caso seja identificada qualquer inconsistência ou eventual vazamento de sinal durante essa fase, as operadoras e a empresa responsável ajustam os equipamentos para garantir que o bloqueio permaneça restrito à área interna da unidade”.
