As lições da democracia numa rua embarrada

Opinião

Helena Tomaschewski

Helena Tomaschewski

Estudante de Direito

As lições da democracia numa rua embarrada

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Na segunda-feira que passou, meu pai me contou que era o Dia Internacional da Democracia. No Brasil atual, quem se mantém bem informado é quase diariamente bombardeado com o significado dessa palavra de valor tão grande. E eu, como estudante de Direito, às vezes mesmo querendo fugir, todos os dias aprendo algo novo sobre a democracia brasileira.

Em uma noite fria, no prédio do Direito, nas primeiras aulas na casa, tive contato com o direito à dignidade humana. Algo básico, que todo cidadão precisa saber e que eu, erroneamente, tinha certeza de já ter compreendido. Mas só no meu segundo ano conheci, na prática, o significado. Eu tinha 19 anos, fiz uma prova para estagiar na prefeitura e caí de paraquedas no gabinete da prefeita.

Aprendi muito, vivi uma oportunidade única de ver o Executivo de perto durante o ano eleitoral e uma das maiores enchentes do Rio Grande do Sul. Porém, o princípio da dignidade da pessoa humana veio até mim numa segunda-feira, ao lidar com o atendimento ao público. Eram oito horas de uma manhã chuvosa e minhas colegas de trabalho ainda não haviam chegado. Toca o telefone, com uma voz irritada e estridente do outro lado:

— Quero fazer uma reclamação! Estava chegando em casa e um caminhão de lixo acabou de passar por uma cratera na rua e me sujar de barro, e agora eu não consigo entrar na minha residência.

Ouvi mais alguns xingamentos inapropriados para publicação e, antes de conseguir pensar em responder alguma coisa — acredito que ele tenha percebido que estava conversando com uma estagiária acordada havia menos de duas horas —, o senhor desligou o telefone.

Entre os tão falados direitos e deveres, como ele conseguiria atingir a dignidade humana nesse caso? Era meu dever, como funcionária pública, dar um banho nesse cidadão pelotense? Enfim, ainda temos uma longa estrada, cheia de crateras embarradas no caminho da democracia a serem preenchidas. E, em relação ao meu aprendizado, descobri que o brasileiro não está perto de compreender o que é dignidade humana — muito menos eu.

E, se o cidadão que sofreu com o barro estiver lendo este texto, saiba que sua pauta foi devidamente relatada à minha chefe para os possíveis encaminhamentos. E desculpe pela falta de preparo diante do caso.

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