Os recentes desdobramentos que envolvem a investigação, na esfera pública, da morte do menino Joaquim Klinger (Joca), 9, durante atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Cassino, em Rio Grande, impulsionaram o pedido de instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Vereadores. Para além de apurar se houve negligência no acompanhamento do menino durante o fato, a proposta é investigar o sistema de pronto atendimento no município.
Um dos vereadores que assinam o pedido, Enio Fernandez Junior (MDB), relata que é de conhecimento do grupo uma série de irregularidades que poderão ser apuradas a partir da CPI. “A partir desse caso, passamos a receber uma série de denúncias de que os protocolos adotados, tanto pela Secretaria de Saúde, quanto pelas próprias UPAs, estão deixando muito a desejar em termos de atenção à saúde básica e primária imediata e urgência do município”, afirma.
A comissão se propõe a apurar a conduta médica e a técnica aplicada pelos profissionais envolvidos no caso Joca, o cumprimento ou não dos protocolos de triagem e atendimento emergencial, a responsabilização de gestores, servidores e profissionais, além das condições estruturais e administrativas das UPAs com a possível omissão de procedimentos essenciais e a existência de falhas repetidas na rede municipal de urgência e emergência.
Enio também afirma que, a partir do que for apurado pela comissão, serão tomadas as medidas consideradas pertinentes, como encaminhamento do relatório para o Ministério Público, Conselho Federal de Medicina e de Enfermagem. “Inclusive eventual denúncia ao MP por improbidade dos servidores envolvidos. Iremos trazer ao conhecimento dos outros vereadores e da comunidade relatos de outros casos bem significativos e que podem estar documentados ou não”, afirma.
Agora, a mesa diretora da Câmara de Vereadores de Rio Grande irá definir os cargos dentro da comissão e as futuras etapas da CPI.
Arquivamento
Na última semana, a prefeitura anunciou o arquivamento administrativo da sindicância que apurava os fatos envolvendo a morte de Joaquim. Ninguém foi responsabilizado e, segundo o executivo, os profissionais envolvidos já haviam sido afastados de suas funções na época do ocorrido.
O processo administrativo interno, que ouviu 14 pessoas entre profissionais e familiares do menino, apurava possível negligência. Com o encerramento das diligências, o conteúdo foi remetido ao Ministério Público para a continuidade da investigação, agora na esfera criminal.
No pedido de abertura da CPI, os vereadores afirmam que a decisão pelo arquivamento pelo executivo foi tomada de forma prematura. “A decisão impede a plena elucidação dos fatos, compromete a confiança da população nos serviços públicos de saúde e viola o princípio da publicidade e do controle social”, diz o documento.
Outro vereador a assinar o documento, Luciano Figueiredo (PSDB), destaca que a CPI será o exercício de uma das responsabilidades do legislativo, de fiscalizar, através de um grande dispositivo para a apuração dos fatos. “O caso do menino Joca marcou a todos nós. Agora é darmos início aos trabalhos, identificar os culpados, caso existam, para que nunca mais nenhuma família passe o que a família e amigos do Joca estão passando”, projeta.
Virgílio Franz, o Gaúcho dos Bairros (PP), destaca que a decisão de arquivamento compromete a transparência e a confiança da população nos serviços públicos de saúde, além de ferir o princípio do controle social.
O documento ainda cita que a morte de uma criança em atendimento de urgência não pode ser tratada como um procedimento burocrático encerrado por decisão administrativa, mas sim como um fato gravíssimo que exige apuração profunda, técnica e transparente.
O pedido de instauração da CPI também é assinado pelos vereadores Filipe Branco (MDB), Flávio Maciel (PL), Giovani Moralles (PRD), Julio Lamim (União), Laurinha (MDB) e Nilton Machado (Republicanos).
Relembre o caso
A criança teria dado entrada no atendimento de urgência da UPA por volta das 3h10min do dia 28 de maio, com sintomas respiratórios. O prontuário médico aponta para uma crise asmática com provável complicação por H1N1. Com a piora do quadro de saúde, Joaquim teve duas paradas cardiorrespiratórias e veio à óbito às 7h15min ainda na unidade de saúde. As anotações indicam que a equipe de enfermagem orientou a intubação do menino por diversas vezes, todas negadas pelos dois médicos que participaram do atendimento.
O caso gerou grande comoção entre os rio-grandinos, com movimentações através das redes sociais e manifestações que levaram os dizeres “Justiça pelo Joca”.
Após o arquivamento do processo administrativo, a mãe de Joca, Izabel Simch, utilizou as redes sociais para posicionar-se alegando que os fatos apresentados na sindicância comprovam que um dos médicos responsáveis pelo atendimento não atestou a gravidade dos fatos, mesmo com reiteradas manifestações da equipe de enfermagem, e solicitou a intubação do menino apenas depois de ter ministrado medicamentos, sem que esses tenham surtido qualquer efeito.
