Das telas às lousas: o desafio dos professores em manter o foco em sala de aula. Em um mundo dominado pela tecnologia, o imediatismo e a lógica da competição desafiam diariamente o professor, figura que se torna cada vez mais essencial para o conhecimento e formação. No Dia do Professor, educadores refletem sobre o que significa ensinar e humanizar em tempos em que o conhecimento parece acessível a um clique, mas a empatia se torna cada vez mais rara.
Quem sente os efeitos das transformações em sala de aula é a professora da rede municipal de ensino Amanda Pereira da Silva, 29. Ela leciona na Escola Municipal Machado de Assis e considera como maior desafio a manutenção do vínculo humano em meio a um mundo de telas. “Os alunos têm acesso a tudo, o tempo todo, mas se perdem entre tanta informação”, observa.
Como professora, considera que seu papel é ajudar o estudante a transformar informação em conhecimento, guiando-o para refletir e dar sentido ao que aprende. “O professor não perdeu o lugar de referência, mas precisa reconstruí-lo. Ele deve ser aquele que provoca, que ajuda o aluno a se encontrar nesse mundo de possibilidades”, afirma.
A professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas (FaE/UFPel), Valdelaine Mendes, explica que humanizar a educação é fazer o estudante compreender que sua condição social e existencial não depende apenas de esforço individual, mas de um conjunto de fatores sociais.
Alternativas
Em meio a uma geração hiperconectada, que chega à sala de aula com acesso fácil a vídeos, tutoriais e opiniões diversas, os educadores precisam disputar espaço com a internet e, ao mesmo tempo, resgatar o valor do conhecimento científico, da escuta e da convivência.
O professor de História do Colégio Adventista, Lucas Cantos, 26, percebe uma transformação no comportamento dos alunos desde a proibição do uso de celular nas escolas. “Eles estão mais desinibidos e mais comunicativos”, destaca.
Para ele, o maior desafio do professor atual é lidar com uma geração altamente tecnológica, que chega à sala de aula com informações vindas da internet, muitas vezes sem base científica. “Nosso papel é ajudar o aluno a desenvolver senso crítico, mostrando a importância de fontes confiáveis e da verificação de informações, sem desqualificar a opinião do estudante”, opina.
Cantos defende que o professor deve ouvir e dialogar antes de corrigir, orientando o aluno a buscar referências sólidas, como livros, autores, bibliografia. Para tornar as aulas mais atrativas e participativas, uma vez que a disciplina que leciona é bastante teórica, o docente utiliza slides, imagens e plataformas interativas nos Chromebooks.
O caminho até a licenciatura
Diferentemente de Lucas Cantos, que descobriu a vocação no final do Ensino Médio, a professora de Matemática da Escola Estadual Monsenhor Queiroz, Rosiane Garcia, 49 anos, sempre sonhou em ser professora. “Desde criança eu brincava de dar aula. Nunca imaginei fazer outra coisa”, diz. Apesar da paixão pela profissão, ela reconhece o cansaço diante das mudanças constantes e da falta de reconhecimento. “Eu já poderia estar aposentada, mas, com as mudanças na legislação, sigo na sala de aula porque ainda gosto muito do que faço.”
Mais desafios na rede pública de educação
Rosiane acredita que o aprendizado está cada vez mais comprometido. Há quase três décadas lecionando, manter o foco dos alunos no conteúdo é seu maior desafio. “A gente enfrenta uma barreira enorme com o uso do celular. Mesmo com leis que tentam limitar, é difícil competir com a tecnologia na mão deles. Tudo é muito rápido, interativo, e a aula no quadro parece monótona diante disso”, comenta.
O professor Mário Luiz Studzinski dos Reis, 58 anos, que atua nas disciplinas de Português e Redação, também no Monsenhor Queiroz, também vê na tecnologia um ponto de ruptura e de oportunidade.
Além dos desafios tecnológicos, Reis destaca o baixo salário e a sobrecarga de trabalho como fatores que desmotivam a categoria. “O professor virou contador. A gente preenche planilhas, relatórios, índices, e sobra pouco tempo para o essencial, que é dar aula. Falta investir na qualificação real”, critica. Para ele, muito se fala em investimento em educação, mas se esquece do principal instrumento dela: o professor.
Ele ainda aponta outro impasse: a pressão por índices de aprovação. “Somos cobrados para aprovar alunos que ainda não estão preparados. Ninguém quer reprovar, mas também não dá para fingir que aprenderam. É um sistema que precisa ser repensado.”