Com 7,47% do eleitorado gaúcho, a Zona Sul do Estado tem potencial para eleger mais do que os três atuais representantes na Câmara dos Deputados e os quatro na Assembleia Legislativa. No entanto, a região historicamente enfrenta dificuldades para transformar seu peso eleitoral em cadeiras efetivas. A um ano das eleições, o movimento do ‘Grupo A Hora: Pensar Eleições 2026 – Metade Sul Forte’ abre o debate para mobilizar a região a fortalecer candidaturas locais. O cenário político-eleitoral, entretanto, divide opiniões de especialistas em política.
A presidente do Instituto IPO, Elis Radmann, avalia que há um movimento positivo em torno da valorização regional, mas que o desafio ainda é estrutural. Para ela, a representatividade da Zona Sul depende de um voto mais consciente e estratégico, capaz de compreender que o sistema proporcional exige coesão e planejamento político. Ao contrário do que se vê nos bastidores dos partidos, que, para manter seus candidatos natos, precisam de muitos outros trabalhando – articulações que fazem parte da competitividade eleitoral e que não aparecem para os eleitores. “É um movimento que faz mal para a cidade”, avalia.
Elis lembra que, em geral, o eleitor brasileiro tende a votar em pessoas conhecidas ou em pautas de afinidade, e não necessariamente em quem tem condições de defender os interesses locais. “A fragmentação das candidaturas é o principal obstáculo. Se cada grupo ou partido lança vários nomes, os votos se diluem e a região perde força coletiva”, destaca. Sem contar que uma das pesquisas realizadas pelo IPO aponta que 95% dos eleitores não gostam de políticos, segundo Elis.
Ela também observa que as regiões mais densamente povoadas, como a Grande Porto Alegre e a Serra, acabam se sobressaindo porque concentram tanto o eleitorado quanto a visibilidade da mídia. “A Zona Sul tem uma presença importante, mas dispersa. A distância entre os municípios e o número reduzido de eleitores em cada cidade dificultam a construção de campanhas com impacto estadual”, analisa.
Já o cientista político Renato Della Vecchia, professor da Furg, avalia que a falta de representatividade não é um problema exclusivo da região, mas consequência direta do modelo eleitoral e da dinâmica partidária brasileira. “O voto no Brasil é fortemente individualizado. As pessoas escolhem candidatos por vínculos pessoais, profissionais ou simbólicos, e não por projetos coletivos. Isso vale para todas as regiões”, afirma.
Della Vecchia reconhece, no entanto, que há uma desvantagem estrutural. “Os nomes mais expressivos costumam estar na Região Metropolitana, onde têm acesso fácil à mídia e a um público maior. Aqui, o território é extenso e a população é mais dispersa, o que reduz a densidade eleitoral e o alcance das campanhas.” Ele lembra que Pelotas e cidades vizinhas nunca conseguiram ultrapassar a marca de dois ou três parlamentares eleitos simultaneamente, mesmo com potencial numérico para isso.
“A nossa representação tem uma clivagem que é regional, e outras que também são importantes para estarem presentes, no sentido de ter um sistema político mais plural, com representantes na cultura, no meio ambiente, na segurança pública e assim por diante. A lógica partidária é competitiva: cada legenda quer garantir alguém do próprio grupo, e isso torna muito difícil a construção de consensos”, diz.
Tanto Elis quanto Della Vecchia concordam que o caminho passa por educação política e fortalecimento das lideranças locais. A presidente do IPO destaca que a conscientização do eleitor é decisiva para mudar o cenário. Para ela, o papel do parlamentar deve ser o de propor soluções estruturais, por exemplo, enfrentando gargalos regionais na saúde, como a falta de cirurgias eletivas ou equipamentos hospitalares de alta complexidade”, avalia.
Para Della Vecchia, o desafio é também formativo. Ele defende que a educação política comece ainda na escola, para que o cidadão compreenda o funcionamento do sistema e o impacto do voto coletivo.