A Câmara dos Deputados aprovou na noite de quarta-feira (20) o projeto de lei que prevê proteção a crianças e adolescentes em ambientes digitais. Apelidado de ‘ECA digital’, o projeto foi apresentado pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) em 2022 e foi aprovado pelo Senado no ano passado.
Como o texto foi alterado na Câmara, passará por nova análise dos senadores. Os deputados avançaram com a proposta após o debate sobre a adultização e o risco da exposição de crianças e adolescentes nas redes sociais.
O tema veio à tona há cerca de duas semanas, quando o youtuber Felca publicou um vídeo em que denuncia a sexualização de menores nas redes sociais e a facilidade no compartilhamento de conteúdos com pornografia infantil. O vídeo de 50 minutos já tem mais de 47,5 milhões de visualizações.
Lei protege a infância
A neuropediatra Camila Halal considera a lei de combate à adultização no ambiente digital importante. “Ajuda a proteger a infância, garantindo que a criança tenha tempo e espaço para crescer no seu ritmo, de forma segura, equilibrada e respeitosa”, afirma.
Ela explica que a exposição de crianças a conteúdos e comportamentos adultos pode atrapalhar o desenvolvimento saudável do cérebro, em especial nas áreas ligadas às emoções e competências socioemocionais. “O cérebro infantil ainda está em formação, e ele precisa passar por etapas próprias para aprender a lidar com sentimentos, criar relações seguras e desenvolver a autoestima”, explica a doutora.
A médica explica que quando a criança é incentivada a agir como adulto, ela pode sentir a pressão por corresponder a padrões que ainda não está pronta para viver, o que pode causar ansiedade, baixa autoestima e dificuldade para lidar com frustrações ou problemas de forma saudável. “Acaba deixando de viver momentos importantes da infância, como o brincar livre, explorar a imaginação e a convivência espontânea”, avalia Camila.
Ambiente digital perigoso
O psiquiatra e psicanalista Eduardo Brod Méndez destaca a importância de se regrar a exposição de crianças às telas. Ele compara a presença nas redes sociais com deixar uma criança sozinha em um lugar desconhecido. “Nas redes sociais, no quarto do adolescente ou da criança, ficaram livres, circulando pelos ambientes mais desconhecidos e perigosos possíveis, tendo contato com qualquer pessoa”, disse.
Para Méndez, um ambiente saudável envolve o acompanhamento, a conversa e a convivência das crianças e adolescentes com seus responsáveis. “É preciso menos tempo de tela e mais tempo de vida real. O problema é que muitos adultos, nós, somos também vítimas, seduzidos por essa quantidade de ofertas das redes sociais”, explica.
O que a lei prevê
A lei cria procedimentos para empresas donas de aplicativos, jogos e redes sociais acessíveis a menores de idade, mas dependerá de regulamentação para definir certos critérios. O objetivo é prevenir abuso, exploração e violência de crianças e adolescentes e evitar a exploração comercial dos menores.
Sites, redes sociais, jogos e aplicativos deverão:
- Bloquear o acesso a produtos e conteúdos impróprios que contenham abuso, violência, jogos de azar e riscos à saúde
- Criar ferramentas de controle parental
- Limitar a coleta de dados pessoais de menores
- Acabar com caixas de recompensa em jogos (loot boxes)
- Aprimorar verificação de idade para o acesso a conteúdos adultos
- Impedir anúncios direcionados a menores com base em análise do perfil
- Contas de crianças em redes sociais deverão ser vinculadas às dos pais
- Alertar sobre os riscos do uso de plataformas e dispositivos
- Denunciar imediatamente às autoridades e remover materiais de abuso infantil
- Publicar relatórios semestrais sobre denúncias e medidas de proteção.
Empresas que descumprirem as regras poderão ser sancionadas, com medidas que vão desde advertência até multas de R$ 50 milhões, além da possibilidade de suspensão temporária.