A leitura do relatório encerra, ao menos no Legislativo, por hora, a questão do caso dos desvios no Pronto Socorro de Pelotas. O documento detalhado, em quase 90 páginas, elaborado pela dupla Jurandir Silva (PSOL) e Rafael Amaral (PP), relator e presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), respectivamente, joga luz sobre um dos capítulos mais assombrosos da história recente da administração pública local. É um escândalo de proporções absurdas e que mexe com um dos setores mais sensíveis de uma comunidade: a saúde.
Fruto de um contrato mal elaborado, em moldes estranhíssimos, excesso de poderes para um administrador e fiscalização estatal frouxa, o cenário inteiro tornou-se favorável para a corrupção. Não é concebível que uma figura que ocupe cargo político dentro de um órgão público consiga criar poderes para si mesmo a ponto de desviar valores. Não é aceitável que nenhum alerta tenha sido emitido para que a coisa fosse freada antes. Não fosse a percepção de Márcio Slaviero, diretor do Hospital Universitário São Francisco de Paula, ao observar notas duplicadas em uma avaliação, talvez a coisa estaria rolando por baixo dos panos até agora.
Aliás, Slaviero é um dos pontos positivos que pode-se tirar dessa situação. Sua percepção freou o esquema e impediu que coisas piores acontecessem. Cabe também elogios a Rafael Amaral e Jurandir Silva, um de direita, outro de esquerda, que uniram-se da maneira mais republicana possível e conduziram a CPI de maneira impecável. A prefeitura acionou os órgãos de controle quando Slaviero alertou da situação. Era o mínimo, mas ao menos não houve mais omissão.
A lição que fica é que é necessário olhar cauteloso na hora de indicar cargos de confiança e ao conceder poderes para tais postos. Roubar na área da saúde é o maior tipo de sem-vergonhice possível e espera-se que a condução das investigações do Ministério Público encerre com denúncias e posteriores condenações, dentro dos trâmites legais da coisa toda. Mas, antes de tudo, é preciso reforçar o controle e o alerta para novos esquemas que desviem recursos de uma cidade que já sofre com a falta de dinheiro.