Há sete anos o grupo Doces Linhas mistura aprendizado e trabalho artesanal a troca de experiências e memórias afetivas ao produzir peças decorativas ou utilitárias a partir do bordado. São 14 bordadeiras que se reúnem semanalmente em um local que tem muitas afinidades com o projeto: o Museu do Doce, responsável por salvaguardar saberes e fazeres.
O grupo teve início em 2017 a partir da disciplina Bordaduras – a vida bordada da Universidade Aberta à Terceira Idade (UNATI), projeto da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PREC), da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). As aulas eram no Museu do Doce e na época a diretora da entidade, a professora Carla Gastaud, estimulou a própria mãe, a professora aposentada da Faculdade de Educação (FaE) Maria Antonieta Dall’Igna, a ministrar essa matéria para a turma de 20 alunos.
Maria Antonieta, 82, que borda desde jovem e fez cursos nesta área, conta que a experiência foi boa, mas achou que o bordado como disciplina não interessava a muitas pessoas. Então, surgiu a ideia de formar um grupo só para bordadeiras da terceira idade. “Tem uma onda de valorização do bordado no mundo inteiro hoje em dia”, comenta a artesã. A proposta teve adesão e virou um Projeto de Extensão do Museu intitulado Doces Linhas: Bordados no Museu do Doce, com coordenação das professoras Carla Gastaud e Noris Leal.
A mão livre
Das mulheres que começaram no grupo cinco permanecem, mas ao longo dos anos outras foram se agregando ao projeto. As reuniões ocorrem nas tardes de quarta-feira. “É aberto para quem quer aprender a bordar”, fala Maria Antonieta.
As integrantes bordam a mão livre e cada uma delas leva seus conhecimentos e dúvidas para partilhar com o grupo. Algumas sabem mais, outras menos, mas todas desenvolvem habilidades nesta área.
Coordenadora, Maria Antonieta propõe também trabalhos em grupo, como a toalha que elas estão bordando com desenhos dos estuques do casarão 8, da praça Coronel Pedro Osório, que abriga o Museu. A peça é um presente para a entidade.
Na pandemia, elas fizeram sachês em forma de coração, doados aos profissionais da saúde da UPA do Areal e do Hospital de Clínicas.
As bordadeiras também participam de projetos sociais, como o Blue Jeans Sisters da artista Belinda Smith, da Nova Zelândia, que usa a costura como forma de protestar contra o trabalho escravo de mulheres e meninas no universo da moda. Elas também bordaram quadros a partir de desenhos do artista Leandro Selister, para a Fenadoce em 2019.
Para a coordenadora, o fato de estarem no Museu é uma oportunidade de ampliar a visão do mundo e de se abrir a novas possibilidades. “Tem coisas que individualmente não vivenciaríamos, como fazemos aqui. É muito importante esse lugar para nós”, fala.
Memória afetiva
Para a participante do grupo, a funcionária pública aposentada Iandora Martins Scherer, 62, bordar remete a uma memória afetiva. A mãe de Iandora bordava, mas ela não chegou a aprender a atividade.
Quando uma colega de yoga falou para ela sobre o Doces Linhas, ela quis conhecer o trabalho. “Eu vim porque minha mãe bordava. Cheguei sem avisar e estou aqui já faz três anos”, conta.
O que começou despretensiosamente hoje é uma parte importante do cotidiano de Iandora. “Aqui a gente socializa e também aprende. A gente se sente útil”, diz.
Em clima de amizade e companheirismo elas produzem peças que podem gerar até uma renda extra. Mesmo sendo uma bordadeira profissional, Nara Berndt, 68, não dispensa estes encontros semanais. “Eu adoro bordar, é um relax mental maravilhoso. É uma terapia. Para mim, bordar é viver”, fala Nara.