Pelotas redescobriu seu Plano Diretor. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, por 8 votos a 2, um decreto legislativo para sustar o decreto da prefeitura que regulamenta construções em áreas baixas da cidade. Jurandir Silva (PSOL) e Ivan Duarte (PT) ficaram na minoria. Agora, o tema vai ao plenário, quando o presidente Carlos Júnior (PSD) decidir pautar. No papel, é um debate sobre forma jurídica. Na prática, porém, é uma discussão sobre que tipo de regra a cidade quer adotar para o uso dos banhados.
O ponto de partida é conhecido: o Plano Diretor proíbe o parcelamento do solo em terrenos baixos, alagadiços ou sujeitos a inundações. Só que essa proibição, genérica, nunca foi cumprida ao pé da letra. “Áreas baixas”, sem definição objetiva, viraram um conceito elástico, muitas vezes resolvido caso a caso na Seurb, a partir de pareceres técnicos. O decreto da prefeitura entra justamente aí, com a promessa de tirar o tema da subjetividade, estabelecendo parâmetros mais claros.
Quem defende o decreto legislativo sustando a norma da prefeitura argumenta que um movimento dessa dimensão deveria voltar em forma de projeto de lei, com debate mais amplo. É uma discussão legítima sobre o instrumento. Mas o efeito prático, se ela vingar, é voltar ao cenário anterior, em que uma proibição ampla no papel convive com decisões pontuais na prática, sem referência tão definida. Para parte do mercado imobiliário, esse modelo é visto como tendo vantagens, porque permite maior flexibilidade na análise de cada caso.
Também entra nessa conta a geografia social da cidade. A água não sobe escolhendo endereço, mas, quando baixa, é fácil ver em que lado do mapa ficam os prejuízos maiores. Em geral, nos bairros populares e vilas que acabam recebendo o impacto de ocupações em áreas sensíveis. Ao mesmo tempo, muitos dos banhados hoje em discussão são áreas antigas, historicamente tratadas como de menor aproveitamento econômico e com preço de entrada mais baixo, o que aumenta o interesse sobre elas quando se fala em infraestrutura e novos investimentos.
Na segunda-feira, uma reunião entre um grupo de vereadores e a Aliança Pelotas, que reúne lideranças empresariais locais, colocou o assunto de novo na mesa sob o rótulo de previsibilidade para investimentos. O plenário, agora, não decide apenas sobre um decreto, mas sobre qual equilíbrio pretende buscar entre expansão, segurança e responsabilidade em áreas baixas da cidade.
Jurandir destituído
A Comissão de Ética da Câmara destituiu, em reunião extraordinária, o vereador Jurandir Silva (PSOL) da presidência do colegiado. A sessão foi conduzida pelo vice, Cesar Brisolara (PSB), e consolidou a força do novo arranjo de direita na Casa. Votaram pela saída Marcelo Bagé (PL), Michel Promove (PP), Marcelo Fonseca (União Brasil), Daniel Fonseca (PSD) e Éder Blank (PSD), enquanto Tauã Ney (PSDB) e Paulo Coitinho (Cidadania) optaram pela abstenção.
Na justificativa formal, os autores do requerimento apontam dois pontos: descumprimento de prazos na tramitação dos processos e falta de imparcialidade de Jurandir, por ser do mesmo partido da vereadora Fernanda Miranda e tê-la defendido em plenário. Com a destituição, uma nova reunião foi marcada para 16 de dezembro, quando será eleito o novo presidente da Comissão.
Na fila da Comissão de Ética estão dois casos: um envolve Fernanda Miranda (PSOL), em processo que pode resultar em suspensão de até 60 dias, a depender do voto da maioria. O outro tem como alvo o vereador Cauê Fuhro Souto (PV), também por suposta infração ao Código de Ética, ainda à espera de desfecho. A votação do processo de Fernanda, que ocorreria agora, foi cancelada, e o de Cauê também fica parado até a definição do novo comando.
Para o leitor entender, a Comissão de Ética que decide se esses processos andam, travam ou mudam de velocidade. Ao trocar o presidente às vésperas das votações, a Câmara redesenha quem controla essa chave. No papel, tudo em nome da técnica e da imparcialidade. Na prática, antes de falar em punição, a política trata de escolher quem tem o poder.
“Se” provisório
O superintendente regional do Dnit no Rio Grande do Sul, Hiratan Pinheiro da Silva, foi mais um a recorrer ao “se” na discussão sobre o fim do contrato da Ecovias Sul no Polo Rodoviário Pelotas. Ele reforça o discurso já adotado por Vladmir Casa, superintendente do mesmo órgão na região, em entrevista recente à Rádio Pelotense. O “se”, no caso, diz respeito à possibilidade de o DNIT ser designado para assumir, provisoriamente, a manutenção das BRs-116 e 392 enquanto a nova concessionária não é escolhida em leilão e assume o trecho, algo projetado para 2027.
Hiratan palestrou na tarde de ontem, na Câmara de Comércio da Cidade do Rio Grande, na última edição do Tá em Pauta em 2025. Em conversa de bastidor, ele justificou: o Dnit se prepara para receber o Polo Pelotas. A ordem veio do Ministério dos Transportes e o trabalho já está em andamento. A autarquia projeta estar pronta, com quatro empresas contratadas, em 3 de março do ano que vem.
Sobre a hipótese de um mandato-tampão, a resposta segue em Brasília: só sai “se” o governo federal assim decidir. E, mesmo assim, envolve uma série de fatores. Na palestra aos empresários, Hiratan reconheceu que o DNIT trabalha com orçamento limitado, o que restringe a oferta de serviços mais abrangentes em relação ao padrão de uma concessão privada.
Uma curiosidade: será a primeira vez na história que o Dnit irá administrar as rodovias pedagiadas da Zona Sul. Há 28 anos, quando a Ecovias Sul assumiu o polo, a autarquia sequer existia (foi criada em 2001). À época, quem dava as cartas era o extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER).