Em uma pequena casinha, escondida entre ruas desenhadas, eu me escondia em silêncio do mundo.
Quando criança, gostava de me esconder.
Meus pais sempre se preocuparam demais.
Se a criança está em silêncio… pronto: está aprontando!
Havia uma porta que ligava minha casa à casa dos meus avós.
Minha avó sempre foi uma doce pessoa.
Quieta, escutava mais do que falava.
Eu, ao contrário, era uma criança de língua solta, que falava de tudo, sobre tudo e com todos.
Em uma tarde, enquanto falava sem parar, puxei um banquinho para alcançar a altura da pia e encher uma caneca com água, enquanto armava em minha mente o que aprontaria.
Corri até o banheiro, peguei um pente e chamei minha avó.
Puxei sua cadeira de rodas e a levei para a frente de casa, justificando que a deixaria ainda mais bonita.
Em silêncio, comecei a molhar o pente na água e a pentear seus finos cabelos.
Minha avó não questionou, não resmungou e apenas permaneceu parada, confiante em sua cabeleireira não tão profissional.
“Eu sou aprendiz, vó. Confia no processo.”
E assim se passou o dia inteiro.
Lá pelas tantas da tarde, minha mãe encontrou a tal criança quieta que tanto apronta.
Encontrou também minha avó com os cabelos encharcados e a roupa toda molhada.
“Meu Deus, por qual motivo deixaste ela fazer isso?”, diziam meus pais, preocupados.
“Ela é aprendiz, deixa ela” – respondeu minha avó calmamente.
Essa história sempre ficou muito clara em minha memória.
E é muito óbvio que não me tornei cabeleireira.
Dez anos após o falecimento de minha avó, percebo que ela tinha razão: eu sou aprendiz.
Após sua ida, fui notando, dia após dia, que essa ideia se concretizava ainda mais.
Aprendi a escrever, aprendi a viver, aprendi a deixá-la ir.
Aprendi a dor do luto, aprendi a força de um ser adulto.
Entretanto, mesmo com os dias passando, sigo aprendendo a cada passo.
Penso que nunca deixamos de ser aprendizes, pois há sempre uma nova lição para aprender, até mesmo com as cicatrizes.