Quando éramos menores, eu achava o meu pai o mais descolado por nos levar ao cinema para vermos filmes infantis: Toy Story, super-heróis ou qualquer tipo de animação. Chegava na escola comentando e dando spoilers aos colegas com pais não tão descolados, que não os levavam ao cinema — coitados.
O tempo foi passando e meu interesse se direcionou a filmes de princesas, adolescentes ou romance, mas meu pai ainda tinha sua missão a cumprir: levar meu irmãozinho para assistir ao novo Homem de Ferro.
Mas logo também já não era do interesse do Joaquim ser visto no cinema — ou em qualquer lugar público — com o nosso pai.
Ele até tentava. Convidava o Joca, já pré-adolescente, para ver Procurando Dory, que, segundo o pai, era um “baita filme”. Meu coração apertava por acreditar que ele devia se sentir escanteado pelos filhos e até meio carente, mas não o suficiente para me fazer ser vista com um familiar em lugares públicos também.
Então, aleatoriamente, ao revirar o closet dos meus pais à procura de uma blusa, encontrei uma coleção de histórias em quadrinhos preservadas em ótimo estado e nunca apresentada a nós. Desço as escadas correndo para questioná-lo sobre o porquê de nunca ter nos apresentado aquele tesouro escondido. E, para minha surpresa, encontro meu pai assistindo Kung Fu Panda 3, sozinho no sofá.
Foi aí que eu entendi.
O meu pai realmente era ótimo nos levando ao cinema e proporcionando aquelas experiências. Mas não era descolado, era um nerd. Um nerd que até hoje gosta de super-heróis, animações e histórias em quadrinhos. Várias perguntas passaram pela minha cabeça adolescente: “Como eu não percebi antes? Será que outras pessoas já sabem? Já notaram? E o preconceito que ele deve sofrer? Como eu vou lidar com o preconceito de ter um pai nerd? Por que ele não me contou? Como eu fui descobrir desse jeito?”
Atualmente, depois de ser desmascarado por sua filha e ter sua real identidade revelada, não se sente mais envergonhado por suas preferências, mas ainda não o suficiente para ir ao cinema sozinho ver uma animação infantil. Eu o aceito como ele é. Hoje em dia, Jarbas e sua criança interior veem suas animações infantis no conforto de seu sofá, graças ao poder da Netflix.
Desculpa, pai, por te tirar do armário — ou closet — dos super-heróis, mas já era a hora de o mundo saber.