Depois de mais de um mês de idas e vindas, o vereador Marcos Ferreira, o Marcola (UB), vai enfim assumir a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária em 11 de novembro. O nome dele foi anunciado ainda no fim de setembro, mas a posse ficou suspensa em meio a ajustes políticos e contrapartidas exigidas pelo governo Marroni.
Durante esse tempo, Marcola viveu o mundo da Câmara, mas com um pé na secretaria. Seguia como vereador, mas chegou a falar e agir como secretário, como em entrevista ao Debate Regional, da Rádio Pelotense, quando apresentou planos e compromissos para a pasta. Entre as promessas, destravar obras e ampliar os programas de regularização fundiária.
Nos bastidores, o entrave maior era político. Além das negociações internas sobre cargos e indicações na secretaria, pesava uma condição: a expectativa de um desfecho favorável ao Executivo no caso da vereadora Fernanda Miranda (PSOL) na Comissão de Ética, processo em que o próprio Marcola é o relator. A resolução desse impasse ainda não ocorreu, mas é vista como a senha para destravar a posse.
Além disso, há um movimento mais amplo, já explicado em colunas anteriores. A entrada de Marcola no governo é parte de uma costura para consolidar maioria na Câmara de Vereadores. Ao levar o vereador para o secretariado, Marroni tenta atrair de vez o União Brasil e o PSD para a base de apoio, formando um bloco de 11 vereadores e garantindo governabilidade nas votações mais sensíveis do segundo ano de mandato. Na prática, a posse de Marcola é um gesto político, pensado para equilibrar forças e ampliar o raio de influência do governo no Legislativo.
A Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária (SHRF) é responsável pelas políticas habitacionais do município. Cabe à pasta a regularização fundiária de áreas sob posse do município, o gerenciamento de programas como o Banco de Materiais, que arrecada sobras de construções e reformas para redistribuir a famílias em situação de vulnerabilidade, e a coordenação das inscrições, pré-seleções e acompanhamento de beneficiários dos programas federais Minha Casa, Minha Vida e Cartão Reforma. Atualmente, a secretaria é conduzida pela arquiteta Marta da Rosa e Silva. Na Câmara, o suplente de Marcola será Marcelo Fonseca, também do União Brasil.
Ambiente tensionado
As reuniões da Comissão de Constituição e Justiça e da Comissão de Orçamento e Finanças, que costumam ocorrer às terças na Câmara de Vereadores de Pelotas, não aconteceram ontem. O presidente das duas comissões, vereador Cesar Brisolara (PSB), disse que o clima tenso entre as lideranças partidárias no plenário o levou a adiar os trabalhos. Na pauta que acabou suspensa estavam temas pesados, como a reformulação do conselho municipal de proteção ambiental (Compam), as diretrizes da Lei Orçamentária de 2026 e o debate cultural e jurídico sobre a proposta de impedir o uso de recursos públicos em eventos que façam apologia ao crime, às drogas ou à sexualização de crianças e adolescentes.
Antes disso, por cerca de uma hora e meia, os vereadores gastaram energia em torno de moções. Uma delas manifesta apoio e solidariedade aos policiais do Rio de Janeiro que participaram da recente operação nos morros. O embate colocou de um lado quem enxerga a ação como enfrentamento legítimo ao crime organizado e, de outro, quem sustenta que a matança não resolve o problema da violência. No fim, a moção passou. Nada disso, porém, alterou a vida prática de Pelotas.
Sombras do poder
O Senado Federal instalou nesta semana a CPI do Crime Organizado, uma tentativa de enfrentar de forma coordenada a expansão das facções e milícias no país. A comissão, proposta pelo senador Alessandro Vieira (MDB), nasce com a missão de investigar como esses grupos se estruturam, se infiltram no Estado e movimentam grandes volumes de dinheiro, dominando territórios e atividades econômicas. Serão 120 dias de trabalho, com 11 senadores titulares e sete suplentes, para mapear redes de financiamento, vínculos com agentes públicos e apontar mudanças na legislação que rompam o ciclo de impunidade.
O pano de fundo é pesado. A CPI surge logo depois da operação policial no Complexo do Alemão e na Penha, no Rio de Janeiro, que deixou mais de cem mortos e reacendeu o debate sobre o tamanho real do poder paralelo que atua nas cidades. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (UB), disse que o Estado precisa reagir “com união e coragem”. A frase é boa, mas é preciso que saia do papel. As CPIs no Brasil costumam nascer cheias de boas intenções e morrer sufocadas por acordos políticos.
De concreto, o que se espera é que essa comissão consiga enxergar além do eixo Rio–São Paulo e dos grandes comandos nacionais. O crime organizado se pulverizou. A CPI do Crime Organizado é uma oportunidade rara de o poder público admitir que o problema não é apenas de polícia, é de governança. É a chance de expor um sistema que se alimenta da ineficiência institucional e do medo.