Joaquim Mello: cinco décadas de empenho pelo aperfeiçoamento da agropecuária

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Joaquim Mello: cinco décadas de empenho pelo aperfeiçoamento da agropecuária

O engenheiro agrônomo foi pioneiro na introdução da raça Angus na região Sul e na difusão da técnica de plantio direto integrada à lavoura e à pecuária

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Joaquim Mello: cinco décadas de empenho pelo aperfeiçoamento da agropecuária
O trabalho do pecuarista foi reconhecido pelo governo do Estado (Foto: Jô Folha)

Aos 79 anos, Joaquim Francisco Mello acorda todos os dias às 5h para se dedicar à administração de três estâncias: Santa Eulália, em Pelotas; Santo Antônio, em Tapes; e Taleira, em Pedras Altas. Hoje está mais afastado das atividades diretas no campo, mas, ao longo de 50 anos, o engenheiro agrônomo dedicou seus dias ao aperfeiçoamento da agropecuária. Mello foi um dos primeiros a produzir Angus na Região Sul e a se debruçar sobre o melhoramento genético da raça. Mas, para isso, antes foi pioneiro em outro aspecto: difundiu o plantio direto com a integração lavoura-pecuária — técnica de cultivo que preserva o solo, melhora o plantio e, consequentemente, a alimentação do gado.

Recém-formado, aos 23 anos, Joaquim Mello assumiu a estância Santa Eulália, localizada a 25 quilômetros do perímetro urbano de Pelotas. A propriedade da família — com um longo histórico na pecuária, desde a importação de gado da Inglaterra por volta de 1800 — estava arrendada havia 36 anos, por falta de quem comandasse o negócio. “Eu me deparei com um cenário muito difícil. Eu não conhecia direito a estância e os campos aqui tinham um solo muito pobre”, relata.

Mello praticamente mora na estância (Foto: Jô Folha)

O propósito de criar gado tinha como impasse a falta de alimentação adequada, por conta da vegetação deficiente em nutrientes. Mesmo assim, o jovem agrônomo decidiu investir na criação com a compra de duas liquidações de Hereford e Devon, raças conhecidas por se adaptarem bem a pastagens de baixa qualidade. “Mas eu fui vendo que isso não tinha um bom futuro, porque como eu ia fazer uma coisa boa com uma alimentação ruim?”, questiona.

Na mesma época, por volta de 1972, começou a chegar a soja na Região Sul. Com tendência a apostar em inovações no campo, Mello plantou a primeira lavoura no pior potreiro da Santa Eulália. Três anos depois, o investimento foi na complementação com o arroz e, no pós-colheita, as áreas eram plantadas com pastagem de azevém. “Montei um rodízio: dois anos eu fazia soja, trocava de potreiro e depois pastagem. Fiz isso em toda a propriedade, e isso foi evoluindo.”

Embora hoje pareça uma estratégia simples, há mais de 50 anos a técnica ainda era pouco conhecida. Em paralelo à integração lavoura-pecuária, o engenheiro agrônomo assumiu a administração de outra estância, em Tapes. Da mesma forma que a Santa Eulália, a Santo Antônio estava arrendada havia cerca de quatro décadas antes de Joaquim Mello retomar a propriedade. Dessa vez, o desafio no novo espaço era a praga do arroz vermelho nas lavouras.

Para enfrentar o problema, Joaquim Mello adotou o plantio direto, sem revolver o solo, já que, quanto mais a terra era mexida, mais o arroz vermelho se espalhava. Para viabilizar a técnica, foi necessário adaptar os maquinários, pois não existiam equipamentos capazes de depositar as sementes sem revirar a terra.

A difusão do plantio direto

O pecuarista destaca uma série de vantagens encontradas nessa estratégia, entre elas o combate à erosão do solo e a economia nos gastos de plantio. “Dá uma chuva e, em seguida, podemos seguir plantando de novo. É mais barato, gasta menos óleo diesel por hectare, menos trator, barateia muito as lavouras até hoje.”

Com o resultado positivo, a técnica foi levada também para o cultivo de soja na Santa Eulália e, a partir disso, surgiu uma integração mais aprimorada entre lavoura e pecuária. O aprimoramento não ficou restrito às propriedades administradas por Mello. Em Pelotas, foi criado o Clube de Integração e Troca de Experiências (Cites), onde produtores rurais compartilhavam técnicas de agropecuária.

Entre as atividades, os dias de campo se destacavam, atraindo atenção para o plantio direto, que, aos poucos, foi se espalhando. “Mais de seis Cites espalharam a integração por várias regiões do Estado.”

A chegada da raça Angus

Com o sucesso de produtividade da integração lavoura-pecuária e do plantio direto, Mello alcançou o que tanto almejava no início da trajetória como produtor rural na Santa Eulália: ter pastagem de qualidade para produzir carne de alto padrão. “Hoje eu planto ao redor de 2,7 mil hectares de pastagem [entre as três propriedades].”

Com a raça pouco conhecida nos anos 1980, Mello tinha apenas alguns Angus na cabanha, mas percebeu que ela “engordava na frente das outras”. Essa leitura foi o suficiente para ele comprar um plantel da variedade bovina e, pouco tempo depois, o Angus passou a dominar toda a criação do pecuarista.

Na Santa Eulalia, dois armários inteiros reúnem os troféus e homenagens conquistadas pelo produtor (Foto: Jô Folha)

“Nessa época não tinha Angus nessa região, e aí começou a minha história com Angus. Seguindo o rumo de sempre aperfeiçoar as coisas, em 1986 eu fui à Argentina e comprei 12 vaquilhonas e um touro para trazer para cá.”

O reconhecimento da raça e do pecuarista

A pedido de um corretor, em 1992, Mello vendeu o primeiro touro em Pelotas e, desde então, a raça — conhecida pela excelência da qualidade da carne — se propagou pela região e pelo país. A criação de Angus e a introdução do plantio direto renderam a Joaquim Mello a medalha Assis Brasil, maior honraria do Rio Grande do Sul concedida a personalidades que tenham se destacado por serviços de excepcional mérito na agricultura e na pecuária.

Mello também foi presidente da Associação Brasileira de Angus, diretor do setor de melhoramento genético de carne e, atualmente, ainda integra o conselho da entidade. “O grande boom [do Angus] foi em 1999, e não parou mais — explodiu no Brasil. Hoje o Acre tem Angus.”

A dedicação contínua

Após mais de cinco décadas dedicadas à agropecuária, Mello segue em plena atividade, comandando os negócios a partir do escritório instalado na casa de estilo colonial, situada no coração da estância Santa Eulália, de mais de 2,5 mil hectares. Raramente vai à sua residência oficial, na Rua 15 de Novembro, no Centro de Pelotas e, com o apoio dos quatro filhos, continua atuando para o aprimoramento da agricultura e da pecuária. “É uma satisfação, eu posso falar hoje que por onde eu andei, tive sucesso”.

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