O encerramento do Dia do Patrimônio, em Pelotas, foi marcado por um olhar atento sobre um dos mais importantes símbolos da luta sindical no município: a Casa do Trabalhador, na rua Santa Cruz, 2.464A. Em evento realizado no prédio histórico de mais de 135 anos, a arquiteta Simone Neutzling, da Perene Patrimônio, apresentou, junto à sua equipe, as etapas já concluídas e os próximos passos do processo de preservação do espaço. A pesquisa histórica, coordenada pela historiadora Olívia Nery, também foi apresentada ao público, formado por representantes de sindicatos, membros da comunidade e autoridades.
Segundo Simone Neutzling, o projeto é mais que uma restauração física: trata-se de um processo de preservação que valoriza o patrimônio dos trabalhadores, frequentemente esquecido em comparação aos casarões e palacetes ligados à elite. “Escolhemos o Dia do Patrimônio justamente para reforçar a ideia de que também é fundamental preservar a memória operária, os espaços de luta e resistência”, destacou.
A preservação começou no ano passado pela fachada, que recebeu pintura com tinta à base de cal, técnica tradicional que remete à origem do prédio. A iniciativa também unificou a identidade visual, já que, antes, cada sindicato utilizava uma cor diferente em sua parte da edificação. “A ideia foi dar unidade, reforçando que se trata da Casa do Trabalhador, e não apenas de espaços isolados”, explicou a arquiteta.
Outro avanço foi a definição de um padrão de sinalização externa. Cada sindicato terá agora uma placa padronizada, reforçando a identidade coletiva do imóvel.
Pesquisa histórica
Um dos pontos altos do evento foi a apresentação da pesquisa histórica e iconográfica coordenada por Olívia Nery. O estudo revelou detalhes das diferentes fases de ocupação do prédio, que começou como a fábrica Luiz Beltrão de velas e sabão em 1889, transformou-se em sede sindical em 1945 e, desde então, segue sendo referência para o movimento dos trabalhadores.
Além da trajetória sindical, o levantamento também identificou um capítulo pouco conhecido: entre 1955 e 1974, funcionou no local a escola Lindolfo Collor, construída em madeira com sistema pré-moldado, semelhante às brizoletas idealizadas no governo de Leonel Brizola, de 1959 a 1963. “É uma descoberta que reforça a multiplicidade de usos e significados da Casa do Trabalhador”, explicou Simone.
Durante o evento, o público pôde interagir com a história. Foram apresentadas três linhas do tempo: da fábrica, da escola e da Casa do Trabalhador.
Futuro do prédio
Com a pesquisa concluída, a próxima etapa será a elaboração do projeto de restauração. O objetivo é preservar as características originais da antiga fábrica, ao mesmo tempo em que se qualificam os anexos e espaços utilizados atualmente. A expectativa é buscar recursos por meio de leis de incentivo e parcerias institucionais.
O prédio, segundo os responsáveis, encontra-se em bom estado, mas precisa de intervenções para garantir sua conservação a longo prazo. “O que queremos agora é restaurar a parte mais antiga e reciclar os demais espaços, qualificando os espaços para os usos existentes”, explicou a arquiteta.
Três pilares
A proposta futura é transformar a Casa do Trabalhador em um espaço multifuncional, sustentado por três pilares: um centro cultural, para atividades voltadas à arte e cultura operária; um centro educacional, a ser desenvolvido a médio e longo prazo; e um centro de memória, destinado a resgatar e organizar o acervo histórico dos sindicatos e da própria casa.
Para isso, três painéis foram instalados no prédio, permitindo que visitantes deixem registros de suas lembranças. “É um espaço de luta, mas também de vida comunitária”, reforçou Lucas Couto, representante da diretoria da Casa.
Patrimônio vivo
Mais que um prédio histórico, a Casa do Trabalhador simboliza 80 anos de mobilização sindical e resistência popular. Ao longo de sua trajetória, abrigou fábricas, escola e sindicatos, atravessando gerações de trabalhadores e servindo como palco de debates, reivindicações e conquistas. “O futuro da Casa do Trabalhador depende da valorização da sua história. Preservar este espaço é preservar a memória do trabalho e da luta em Pelotas”, resumiu Simone Neutzling.