A floração dos pessegueiros é o prenúncio de que a colheita se aproxima. Com a perspectiva de boa safra para 2025, o volume colhido pelos cerca de 900 produtores familiares de Pelotas e arredores deve alcançar 45 milhões de quilos da fruta. Tradição centenária pelotense, o cultivo de pêssego é responsável por abastecer a quase totalidade das compotas consumidas em todo o Brasil e pela geração de emprego e renda, que a cada safra gira em torno de quatro mil postos.
A história do pêssego na região começa com a chegada dos imigrantes portugueses e franceses, responsáveis pelo plantio das primeiras mudas, o que, segundo produtores, remonta ao ano de 1880. A partir da descontinuidade de outros cultivos importantes, como a uva, os parreirais foram sendo substituídos pelos pomares e a produção de vinho pela fabricação de pêssego em calda.
O bom desempenho dos pessegueiros no clima do interior de Pelotas e Morro Redondo somado ao auge do setor de conservas, atraiu dezenas de indústrias do centro do país para a produção de compotas na região. Nas décadas de 60 e 70, havia em torno de 50 fábricas instaladas em Pelotas e em torno. Entre elas, grandes empresas paulistas como a Cica, que funcionava no atual pavilhão de eventos da Fenadoce, e a Vega. A atividade das indústrias de conservas começou a declinar nos anos 90 devido à mudança nos hábitos alimentares da população.
Mesmo diante da crise, a cadeia produtiva do pêssego foi mantida pelos agricultores familiares que deram origem à cultura na região. “Muitos [de fora] não conseguiram se adaptar porque o pêssego é um trabalho muito peculiar. Na lavoura tem que ter um conhecimento passado através das gerações e a indústria é igual”, diz o presidente do Sindicato das Indústrias de Doces e Conservas Alimentícias de Pelotas, Paulo Crochemore.
Das 50 indústrias que já atuaram com pêssego, atualmente há dez em atividades, todas agroindústrias familiares. Além disso, com a descontinuidade dos pomares industriais cultivados pelas empresas, os 16 mil hectares plantados foram reduzidos para 4,6 mil. No entanto, os produtores não veem com saudosismo os chamados “tempos áureos” da industrialização da fruta. Com orgulho, destacam que, por meio da persistência e do empenho da agricultura familiar, a cultura pessegueira permanece viva, promovendo o mesmo desenvolvimento que a consolidou no passado.
Emprego da tecnologia
Com o avanço tecnológico promovido pela Embrapa em apoio ao cultivo, foi possível alongar as safras e ampliar para nove o número de variedades da fruta. O que permitiu expandir a produtividade mesmo com a diminuição no número de fruticultores. “Conseguimos melhorar a quantidade produzida por hectare”, diz o presidente da Associação de Produtores de Pêssego da Região de Pelotas, Adriano Bosenbecker.
Produção que abastece a indústria nacional
Atualmente, praticamente toda a produção de pêssego é dedicada a fabricação de compotas e em sua maioria absoluta as latas da fruta em calda que estão nas prateleiras de mercados de norte a sul do Brasil são de origem das indústrias familiares de Pelotas e região. Com a perspectiva de boa safra para este ano, entre novembro e dezembro, deverão ser produzidas pelas dez empresas de 45 a 50 milhões de compotas para ser estocadas e comercializadas ao longo do ano.
“Você trabalha dois meses, faz um investimento de um ano inteiro, trabalha com um grande número de pessoas, e coloca todo esse produto em depósito para vender ao longo do ano de pingadinho. O pêssego é cultural, a gente se adaptou a isso, a gente trabalha o ano inteiro para ter uma renda ao final do ano”, diz Crochemore sobre a peculiaridade do mercado pessegueiro.
Geração de emprego e renda
Para a fabricação das dezenas de milhões de compotas em um espaço de tempo tão curto, as indústrias fazem uma força tarefa e empregam cerca de quatro mil pessoas. “Se a safra deste ano for boa como a gente está projetando, vão ter industrias que terão que trabalhar três turnos. Tem industrias que buscam pessoas em Rio Grande, aqui de Pelotas são vários ônibus com trabalhadores da zona urbana para as empresas”, destaca Crochemore.
Da mesma forma, para a colheita dos pêssegos, centenas de pessoas são empregadas nos pomares pelos produtores. Diante da boa remuneração, é comum que trabalhadores planejem as férias para o fim de ano a fim de poderem atuar na safra da fruta. “E durante a colheita, a pessoa faz, facilmente, uma diária de R$ 300 a R$ 400. Em 15 dias fazem de R$ 5 mil a R$ 6 mil e ainda têm mais uns dias de férias para descansar”, detalha Bosenbecker.
Pelotas entre os dez maiores produtores do mundo
Conforme Paulo Crochemore e Adriano Bosenbecker, desde 2008 existe um movimento de união entre as indústrias de compotas e os fruticultores para o fortalecimento da cadeia do pêssego. Trabalho que tem dado bons frutos, por meio da mobilização, Pelotas foi inserida no circuito de produtores e hoje integra o grupo dos dez maiores produtores de pêssego em calda do mundo.
Bosenbecker destaca que países como, China, Espanha, Estados Unidos, que também são referência em produção, têm vantagens como o cultivo dos pomares em grandes áreas e em diferentes localidades com diversificação do clima. Mas mesmo assim Pelotas consegue se destacar entre as potências. “Aqui a gente produz praticamente em um só município e conseguimos estar entre os maiores produtores mundiais”.
Em 2023, Pelotas foi sede do encontro de produtores de compotas, reunindo representantes desses dez países. Em agosto, Crochemore seguirá para a China, onde participará de uma nova conferência internacional, representando a cultura pessegueira, além de Pelotas e municípios da região. “Com o passar dos anos a gente vem se solidificando, eu imagino e acredito nisso, se não, não estaria nesse segmento nem passando para os filhos”, ressalta.