“Temos um vínculo de muita confiança com as lideranças pesqueiras”

Abre aspas

“Temos um vínculo de muita confiança com as lideranças pesqueiras”

Liandra Caldasso - professora e pesquisadora da Furg

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“Temos um vínculo de muita confiança com as lideranças pesqueiras”

Recentemente, o Encontro Regional dos Pescadores e das Pescadoras Artesanais da Lagoa dos Patos reuniu, no campus carreiros da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), representantes de 44 comunidades pesqueiras de 14 cidades da região. Do evento, foi elaborado, de forma conjunta e participativa, um protocolo de consulta para que estes trabalhadores possam defender territórios e seus modos de vida.

A união entre comunidade pesqueira e pesquisadores têm demonstrado que a integração dos saberes locais com a contribuição da universidade, favorece a conquista e manutenção de direitos, sendo uma via de mão dupla na produção acadêmica.

Entre as diversas pessoas que contribuem para este processo está a professora do Instituto de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis (Iceac/Furg-SLS), pesquisadora do Laboratório Interdisciplinar MARéSS e coordenadora do projeto de extensão que integrou a construção do protocolo de consulta, Liandra Caldasso. Formada em economia pela Furg, tem especializações em Ciências Sociais e Políticas Públicas, e trabalha com a pesca artesanal há mais de 20 anos.

Como a sua trajetória acadêmica se encontrou com a de pescadores artesanais?

Tenho envolvimento com a temática da pesca artesanal na Lagoa dos Patos, principalmente na área do estuário, desde o período da graduação. Venho acompanhando o Fórum da Lagoa dos Patos aqui no sul do Brasil, mas também acompanho o trabalho de outras comunidades pesqueiras na região costeira do Rio de Janeiro e da Bahia, sempre com enfoque na valorização das comunidades pesqueiras, a importância dos pescadores artesanais para a conservação dos recursos naturais e a importância do envolvimento das pescadoras e pescadores na gestão da pesca. Eu sempre defendi nos meus trabalhos que, para que haja o uso sustentável dos recursos pesqueiros, os pescadores e as pescadoras têm que estar envolvidas nas medidas de gestão, eles têm que estar apropriados de como acontece as decisões do que vai afetar a vida deles.

Como foi o trabalho até a elaboração do Protocolo de Consulta das Comunidades Tradicionais Pesqueiras?

O documento visa que antes da implementação de grandes empreendimentos, as comunidades pesqueiras impactadas sejam consultadas sobre como eles querem que funcione a consulta a eles. Hoje, um dos principais instrumentos previstos no licenciamento ambiental são as audiências públicas, só que elas são insuficientes para ouvir de fato a perspectiva e os impactos nas pessoas. Em 2023, nós recebemos o convite do Ministério da Pesca para submeter propostas a um edital para a extensão pesqueira com as comunidades tradicionais. Junto com a professora Tatiana Valter e o professor Cristiano Quaresma, elaboramos o projeto em parceria com o movimento dos pescadores e pescadoras artesanais, com quem já tínhamos vínculo em nossas pesquisas e a demanda diante das ameaças de grandes projetos para a região.

Qual tem sido o papel da universidade, na sua visão, no auxílio e defesa desses trabalhadores e suas famílias?

As universidades federais e todas as instituições de ensino públicas são diversas, múltiplas. Tem pesquisadores que trabalham com o meio ambiente ou com o ambiente marinho, mas não trabalham com a pessoa, tem um enfoque mais sobre os aspectos biológicos. No entanto, nosso enfoque, tendo em vista que nós somos pesquisadores da área social, nosso enfoque são as pessoas. Nossa principal intervenção e contribuição se dá realmente na organização, mobilização e fortalecimento da organização dos pescadores e pescadoras. O Fórum da Lagoa dos Patos nos aproxima muito dos pescadores e a gente tem, assim eu posso dizer com muita alegria, um vínculo de muita confiança com as lideranças pesqueiras da região e isso permite ampliar as contribuições.

Quais são os desafios que ainda encontras?

Tem muito a questão do orçamento e das políticas públicas educacionais para o ensino superior. A gente tem vivenciado, nos últimos anos, um processo de esfacelamento do orçamento das universidades federais, o que dificulta muito as atividades extensionistas e de pesquisa. Então, por exemplo, para se ir a campo, acompanhar os grupos, é necessária estrutura como veículos, motoristas, e isso é bastante difícil no contexto que a gente vivencia hoje dentro das universidades, tanto para a extensão, quanto para o ensino e pesquisa. A gente tem uma dificuldade imensa de executar atividades de campo.

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