“Nascer no quilombo é saber que você terá mais do que histórias para contar”

Abre aspas

“Nascer no quilombo é saber que você terá mais do que histórias para contar”

Laurena Tavares é Acadêmica de Jornalismo

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“Nascer no quilombo é saber que você terá mais do que histórias para contar”
Estudante é natural do Pará

Prestes a realizar o sonho de um intercâmbio, a acadêmica do curso de Jornalismo da UFPel já está acostumada a desbravar novos territórios. Natural de Oriximiná, no extremo Oeste do Pará, Laurena Tavares nasceu e foi criada no Quilombo Boa Vista. Graças ao programa de cotas, chegou a Pelotas e à UFPel e, em breve, deve partir rumo à Espanha.

Como nasceu o teu interesse pelo jornalismo?

Sempre gostei de ler e escrever — tanto que estou prestes a lançar meu primeiro livro. No entanto, o desejo de cursar Jornalismo surgiu por acaso. Ingressei na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), no curso de Sistemas de Informação, e lá fui contratada como bolsista para um projeto governamental chamado Saúde e Alegria. Viajávamos pelos quilombos para avaliar as condições de saúde da população quilombola, e foi aí que minha percepção sobre a exclusão do nosso povo se intensificou. Cada vez que alguém me pergunta como é viver em um quilombo ou por que precisamos de cotas, percebo ainda mais a urgência de sermos vistos. E acredito que a comunicação é o caminho para isso.

Como integras os saberes adquiridos no quilombo com as práticas diárias?

Carrego comigo os ensinamentos da oralidade, da coletividade e do respeito à natureza e aos ancestrais. No dia a dia, busco equilibrar os conhecimentos acadêmicos com os saberes tradicionais. Cada trabalho que apresento na universidade é voltado para os povos tradicionais — na nossa visão, na nossa vivência e no nosso conhecimento. Por exemplo, ao fazer uma reportagem, não penso apenas no dado técnico, mas também em como aquilo afeta as pessoas do território. Tento trazer uma visão mais ampla, menos colonizada e mais conectada com a realidade das comunidades. Desenvolvi um projeto chamado Inclusiva, no qual criamos conteúdos jornalísticos com o objetivo de dar visibilidade aos estudantes indígenas, quilombolas, negros e demais cotistas dentro da universidade.

Como surgiu a oportunidade para o intercâmbio na Espanha?

Desde que entrei na universidade, sempre tive o foco de fazer um intercâmbio. Sabemos que, no jornalismo, a corrida profissional é desafiadora e, por ser quilombola, mãe e mulher preta, minha caminhada seria ainda mais difícil. Por isso, foquei em fortalecer meu currículo. Em uma dessas buscas, me deparei com a Universidade Autônoma de Barcelona — um sonho que agora está prestes a se tornar realidade. Foi um processo cheio de etapas, mas também repleto de aprendizados. Ser selecionada foi uma conquista coletiva, não só minha.

Qual é a tua expectativa com a viagem?

Quero aprender muito, conhecer outras culturas e formas de comunicação, mas também levar comigo a história do meu povo — fazer com que meu povo seja visto. Tenho o desejo de compartilhar nossas lutas e conquistas com pessoas de outras partes do mundo. E, claro, crescer pessoal e profissionalmente com cada experiência que a viagem me proporcionar. Tenho muitos sonhos profissionais, e espero que esse esforço me ajude a realizá-los. Ainda não sei se a viagem será possível, pois os custos serão por minha conta — e isso ainda é uma barreira a ser vencida. No entanto, expectativa é o que não me falta.

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