No aniversário de 168 anos, Canguçu celebra o trabalho do seu povo e aponta os desafios para manter viva uma economia fortemente ligada ao campo. Reconhecido como o maior número de minifúndios no Brasil e autodeclarada capital da agricultura familiar, o município vive um momento em que o comércio cresce e o turismo começa a se desenvolver, mas ainda enfrenta dificuldades por depender muito da produção primária.
“Mais de 70% da nossa renda vem da agricultura. […] É ela que verdadeiramente mantém a máquina pública em funcionamento”, afirma o prefeito Arion Braga (PP), ao destacar a força das lavouras de soja, milho e fumo. A fumicultura, aliás, apresentou colheita estável mesmo após os eventos climáticos que afetaram a região no ano passado.
Apesar da aparente tranquilidade econômica, o município lida com preocupações: a queda na arrecadação provocada por perdas agrícolas e um alto índice de inadimplência em tributos como o IPTU ou outros impostos, cuja dívida ativa ultrapassa os R$ 20 milhões. “Estamos abrindo um balcão de negociação, com 100% de desconto de juros e multas, para ajudar o município e o cidadão a limpar seu CPF”, reforça o prefeito.
A força do fumo

Fumo é a principal cultura do agronegócio canguçuense. (Foto: João Pedro Goulart)
O produtor Edgar Albrecht, de 61 anos, morador da localidade de Lago dos Pereira, trabalha com fumo desde a infância e explica que a escolha da cultura se deu principalmente pela rentabilidade. Hoje, ele divide a propriedade com o filho, que também planta fumo e mantém produção de leite.
O ciclo do fumo ocupa praticamente o ano todo: o plantio começa entre junho e julho, a colheita a partir de novembro e a comercialização vai até abril ou maio. Atualmente, o setor está estável, relata o agricultor. Em anos mais difíceis, os preços baixos conforme a tabela de referência foram um desafio. Nesses casos, a diversificação na propriedade aliviou o prejuízo. “Sempre defenda duas culturas. Se uma falhar, a outra sustenta”, recomenda o produtor.
Sustento para as pequenas propriedades
Segundo Albrecht, o fumo garante uma vida digna para famílias em áreas pequenas, como cinco ou seis hectares. E esse é o caso da maioria das propriedades que compõem o município de Canguçu. “Com o fumo, se vive bem numa área pequena. É uma safra garantida”, afirma.
Sem abdicar das tecnologias e novos conhecimentos sobre práticas agrícolas, além da troca de saberes entre agricultores, o homem diz que segue dois pilares para obter sucesso na lavoura: produtividade e qualidade. Para ele, a atualização no campo é essencial para manter a lucratividade. “Se produtividade e qualidade não andarem juntas, a coisa vai mal”, conclui.
Potencial turístico incentiva projetos

Santuário é visto como um dos potenciais de atração de turistas. (Foto: Jô Folha)
O prefeito vê o turismo como uma das apostas para diversificar a economia local. A principal aposta da gestão é o investimento no Santuário Nossa Senhora da Conceição. A área oferece vista privilegiada de Canguçu, com mirante, praça, trilha ecológica e a Via Sacra. Inaugurado em 2010, abriga uma estátua de 15 metros da padroeira. O local, que fica em um dos picos mais altos da cidade, estava abandonado, segundo o prefeito.
A ideia é transformar o espaço em um parque turístico estruturado, com praça de alimentação, eventos e shows. O projeto já dá seus primeiros passos, com a limpeza, sinalização e, em breve, pavimentação e iluminação do acesso. “É uma beleza da região Sul que não é divulgada”, observa Braga. “Tudo envolve dinheiro, mas vamos começar a fomentar para que aquele ponto seja olhado e visitado. E que nos ajude a atrair turistas.”
As primeiras melhorias já começaram a surtir efeito na movimentação de pessoas no parque durante os fins de semana. A meta é transformar o local em um ponto turístico gerador de renda para restaurantes, hotéis, postos e serviços da cidade.
Ambiente ideal para as oliveiras

Produção de azeite tem crescido no município. (Foto: Jô Folha)
Canguçu é destaque na produção de azeites extravirgem de alta qualidade e reconhecimento internacional. Um dos exemplos é a empresa familiar Fazenda Serra dos Tapes. Em busca de um local ideal para o cultivo das oliveiras, o grupo encontrou no clima e no relevo de Canguçu as condições perfeitas para a elaboração de azeites.
O primeiro pomar foi implantado em 2016, na localidade de Trapeira, em Canguçu. Em 2018, adquiriram nova propriedade no 3º distrito, onde fica a área principal, e o primeiro ano de produção do lagar foi 2021. Entre tantas condecorações, o azeite alcançou reconhecimento internacional ao se tornar a primeira empresa do país a conquistar o prestigiado prêmio Mario Solinas, do Conselho Oleícola Internacional (COI).
Segundo o sócio da empresa, Jerônimo Santos, o reconhecimento do produto também ajuda a valorizar o município. “Quando você tem um produto de qualidade reconhecida sendo feito na cidade, esse prestígio é transferido para tudo mais que a cidade oferece”, diz.
Turismo do azeite e outras possibilidades
O azeite é orgulhosamente rotulado como produto de Canguçu, mas muitos moradores ainda não conhecem sua relevância. Conforme cita Santos, o município vem investindo em infraestrutura, como estradas para facilitar o acesso, e a maioria do público é de fora da cidade. “O turismo é uma chance de mostrar com profundidade tudo o que está em torno da produção do azeite”, pontua.
Além disso, o prefeito canguçuense propõe a criação de uma rota turística rural, agregando o azeite, o parque, as agroindústrias e outros pontos da cidade: “Tem muita gente que nem sabe da qualidade daqui […] Temos que juntar todo mundo, agregar para atrair e divulgar. Só assim o turista chega até aqui”, comenta Braga.
Crescimento do empreendedorismo local
A zona urbana de Canguçu também chama a atenção pelo dinamismo. Segundo o prefeito, a pujança do comércio e da construção civil, principalmente através da mão de obra, impulsionam o crescimento da cidade e sua boa vitalidade econômica. Nos últimos 15 anos, o município quadruplicou o número de alvarás ativos, refletindo um ambiente favorável ao empreendedorismo.
Uma das empreendedoras que embarcou nessa onda foi Suélen Chalana, dona da loja de produtos naturais EcoNuts, inaugurada em 2020. Dois anos antes, a morte repentina do pai motivou uma mudança de hábitos alimentares. Isso despertou o interesse em alimentação saudável e levou à criação da loja como forma de ajudar outras pessoas.
A loja foi uma das primeiras na cidade a trabalhar com a área de nutrição natural, e levou um conceito diferente à população. Segundo Suélen, a pandemia, contraditoriamente, ajudou, pois aumentou a busca por saúde e bem-estar em um período em que o comércio alimentício seguiu operando.
Bom atendimento e compromisso
Com um espaço que vai além do comércio, a empresária acredita na orientação e educação para hábitos saudáveis. Além disso, aposta no relacionamento com o cliente como uma das chaves para a fidelização dos clientes em Canguçu. “Se tu ‘tiver’ um bom atendimento, o cliente não tem por que comprar em outra cidade”, aconselha.
Suelen acredita no potencial da cidade e enfatiza que o sucesso está mais ligado ao comprometimento do que ao porte do empreendimento. “Eu acredito muito no potencial de Canguçu. Se investir com carinho e souber atender bem, dá certo. Aqui tem espaço, sim, para quem quer fazer a diferença”, finaliza.