O investimento em psicologia ainda não é prioridade no futebol. Levantamento feito há um ano pelo ge.globo indicava que seis dos 20 clubes da Série A do Brasileirão não contavam com um profissional dessa área. Mas a pauta vem ganhando espaço e nesta terça-feira (10) o Pelotas anunciou uma contratação que foge do padrão.
Integrante da campanha do acesso à elite estadual do Lobo em 2018 como atleta, Ton Abreu está em fase final da graduação em psicologia. Por isso, sua atuação no Áureo-Cerúleo, inicialmente junto ao elenco sub-20, é supervisionada pela profissional Mariana Griep de Castro.
O ex-volante, que pendurou as chuteiras aos 23 anos, entre 2019 e 2020, explica que o trabalho no Pelotas exige a vivência da rotina do clube para criar vínculos e entender aspectos como o funcionamento da rotina e as metas tanto coletivas como individuais. Ele está inserido na comissão técnica comandada pelo treinador Antônio Freitas.
Tabu no futebol
“A psicologia do esporte é uma área nova da psicologia, ainda tem muita coisa que a gente está estudando, vindo com inovações. É um trabalho em conjunto e que demanda tempo”, afirma Ton, cuja chegada à Boca do Lobo passou por Daniel Carvalho, coordenador do projeto revitalizado das categorias de base e recentemente anunciado como diretor esportivo do Pelotas.
A transição do campo para a psicologia surgiu da experiência de Ton, principalmente logo após finalizar a carreira. Ele conta que a própria terapia pessoal o levou à decisão. “Tive que entrar em contato com esse luto de decidir parar de jogar futebol, uma coisa que eu imaginava que faria por mais tempo”.
A vivência no esporte também o faz apontar tabus e necessidades. “No futebol a gente ainda tem uma cultura no Brasil de não entrar em contato com nossos medos e angústias, que isso é uma questão de fraqueza. Mas a gente vê dados que mostram a importância do acompanhamento. Acredito que deveria ser obrigatório o clube que tem categoria de base ter acompanhamento psicológico”.
Questões que trazem à tona, principalmente com jovens, o lado humano e um possível futuro fora do futebol, já que a profissionalização não chega para todos. “Nosso trabalho não garante resultados. Garante um lugar saudável, de acolhimento, suporte. Em questão de categorias de base, uma questão social também. Daqui a pouco um garoto está sendo cobrado por desempenho e não tem o que comer em casa. Tem algo antes do futebol”, diz Ton, que atuará também com o elenco profissional do Pelotas quando houver a retomada.