Celebrado neste dia 12 de junho, o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil mostra uma realidade persistente que muitas vezes passa despercebida. De 2023 até abril deste ano, 6.372 crianças e adolescentes foram retirados de situações de exploração infantil em todo o país, enquanto em Pelotas, desde 2024, 20 casos foram encaminhados para o Centro de Referência de Assistência Social (Creas).
Os dados nacionais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) também mostram que 86% desses jovens estavam envolvidos nas chamadas “piores formas de trabalho infantil”, com atividades que comprometem gravemente sua saúde, segurança e desenvolvimento. Em Pelotas, os casos mais comuns envolvem a venda de produtos em vias públicas, em casos como o de um jovem, que há dez anos vende balas no Centro para “ter o próprio dinheiro e ajudar a família”.
Ele destaca que, diferente de outros jovens, não deixou de estudar, realizando as vendas sempre no contraturno escolar. “Esse ano eu estudo de noite, então eu venho pra cá de manhã e fico até às cinco da tarde. Antes eu estudava de manhã e vinha vender só de tarde”, explica o jovem.
Para a promotora da Infância e Juventude de Pelotas, Luciara Robe, o desafio começa justamente na naturalização do problema. “Os casos que nos chegam são referentes a trabalho informal de rua, como a venda de produtos nas sinaleiras ou no calçadão da cidade. São práticas difíceis de serem coibidas, pois são aceitas pela sociedade, que acredita estar fazendo um bem ao adquirir esses produtos de crianças e adolescentes. No senso comum é melhor trabalhar do que roubar, entendimento que fere o Estatuto da Criança e do Adolescente”, argumenta.
Quando crianças ou adolescentes são flagrados em situação de trabalho infantil, a primeira atuação é do Conselho Tutelar, que tenta realizar a abordagem, identificar o jovem e notificar os responsáveis. “O próprio Conselho adverte os pais e encaminha para atendimento nos serviços da rede, especialmente o CREAS. Quando necessário, designamos audiência no Ministério Público para orientação e advertência, inclusive quanto à responsabilidade criminal dos pais”, explica Luciara.
O que acontece após o resgate?
Segundo o MTE, após o afastamento da atividade, o jovem é encaminhado à rede de proteção — que inclui o Conselho Tutelar, a Secretaria Municipal de Assistência Social, as escolas e o Ministério Público. O objetivo é assegurar a matrícula escolar ou permanência na escola, garantir acompanhamento psicossocial e, no caso dos adolescentes a partir de 14 anos, promover a inserção em programas de aprendizagem profissional, como o Jovem Aprendiz.
Programas como o Jovem Aprendiz buscam oferecer uma alternativa concreta ao trabalho precoce, com formação técnica em ambientes protegidos. Apesar disso, a promotora alerta que ainda é preciso avançar. “São necessárias ações que ofereçam atividades lúdicas e educativas no turno inverso da escola para crianças e a ampliação de cursos profissionalizantes e vagas em programas como o Jovem Aprendiz para adolescentes. Importante destacar que esses cursos devem ser acessíveis e ofertados de acordo com o interesse e capacidade dos adolescentes”, comenta.
Enfrentamento
Segundo o Executivo pelotense, o município tem intensificado as ações de combate desenvolvendo projetos como o “PETI vai à Escola”, que promove atividades de conscientização com alunos e professores da rede municipal durante o mês de junho. Na última semana, Pelotas recebeu elogios do Ministério Público do Trabalho por suas ações integradas sobre o tema.
Apesar disso, a dificuldade em obter informações corretas dos jovens durante as abordagens segue sendo um obstáculo. “Muitas crianças e adolescentes omitem as informações como nome, escola que estudam ou nome dos pais de forma correta”, destaca a Prefeitura.
Denúncia
Para a promotora, “o papel da sociedade é fundamental”, sobretudo na conscientização de não incentivar o trabalho infantil. “O ato de dar esmolas ou adquirir produtos de crianças e adolescentes que trabalham na condição de vendedores ambulantes os afasta da escola e os deixa em contato com todos os perigos que existem nas ruas. Por isso, é importante que denuncie esses casos ao Conselho Tutelar e à Secretaria de Assistência Social para as intervenções necessárias”, argumenta.
Os casos de trabalho infantil podem ser denunciados de forma anônima pelo Sistema Ipê, canal exclusivo do Ministério do Trabalho e Emprego (https://encurtador.com.br/8zJkx) ou pelo Conselho Tutelar.
Panorama nacional
- 6.372 crianças e adolescentes foram afastados do trabalho infantil no Brasil de 2023 até abril de 2025
- 74% das vítimas são meninos
- 791 casos envolvem crianças com até 13 anos, em que qualquer trabalho é ilegal
- A maior parte das vítimas tem entre 16 e 17 anos
- Setores mais recorrentes: comércio, alimentação, oficinas, agricultura e pecuária