Os caminhos entre a paixão e o amor

Corpo e Mente

Os caminhos entre a paixão e o amor

No mês dedicado aos casais de namorados, saber reconhecer os sentimentos ajuda a manter relacionamentos saudáveis

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Os caminhos entre a paixão e o amor
Todos os seres humanos têm uma predisposição biológica para formar vínculos afetivos. (Foto: Jô Folha)

Falar de amor e de paixão é complexo. Definir sentimentos e a intensidade depende da individualidade, particularidade e características do ser humano. Mas como o Dia dos Namorados vem aí, o Corpo e Mente buscou algumas respostas com psicólogos que possam ajudar os casais a identificarem as fases de um relacionamento.

Reconhecer o que sente um pelo outro, os excessos e a busca de ajuda na hora certa pode ser um passo para quem deseja estar em um namoro saudável. Nesse organograma da paixão, confira algumas considerações dos especialistas Mateus Luz Levandowski, doutor em Psicologia e professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), e Tailan Rutz Bartel, psicólogo e terapeuta da Terapia do Esquema da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), sobre paixão, amor e relacionamento.

  • Existe solteiros convictos ou qualquer ser tem predisposição para se apaixonar?

Do ponto de vista da teoria do apego, todos os seres humanos têm uma predisposição biológica para formar vínculos afetivos. “Bowlby [psiquiatra britânico] descreve o apego como algo fundamental e necessário para o bem-estar. No entanto, a experiência relacional ao longo da vida pode levar ao desenvolvimento de estilos de apego que moldam o modo como se relacionar com a intimidade”, explica Tailan Rutz Bartel. Na Terapia do Esquema, que em psicologia é uma espécie de estrutura mental, como um filtro no nosso modo de ver as coisas, padrões de pensamento, sentimento e comportamento que se formam na infância, é observado que certos esquemas iniciais desadaptativos, como privação emocional, desconfiança/abuso ou isolamento social, podem contribuir para se evitar relações íntimas como forma de autoproteção. Assim, o “solteiro convicto” pode estar, na verdade, em evitação ou hipervigilância, refletindo uma adaptação a experiências de frustração de necessidades emocionais básicas, e não uma ausência de desejo e conexão. “Mas não é algo que podemos dizer sobre alguém. Estar solteiro convicto pode ser mesmo o caminho mais saudável em uma temporada de vida para algumas pessoas”.

  • Quais as características de uma pessoa apaixonada?

Estar apaixonado é muito intenso e muito único, na opinião de, para o psicólogo Mateus Levandowski, além de estar associado à forma como a pessoa consegue receber e expressar esse sentimento, que tem muito a ver com as experiências do início da vida, com as figuras de apego, as pessoas que cuidaram e deram amor nessa fase da vida. “A pessoa apaixonada costuma apresentar a idealização do outro. É normal a gente perceber o outro de maneira, entre aspas, mais iluminada. Estar aberto em receber de forma normal, de forma alegre, boa, desde coisas que são consideradas negativas e positivas, porque, afinal de contas, a gente está idealizando aquela pessoa”, explica. Por isso se percebe tudo que o par faz como algo bom. Para o especialista, a fase de paixão, de idealização do outro é importante para conexão e vinculação. Há alterações fisiológicas, como o bater do coração mais forte quando pensa ou vê. “É uma série de alterações comportamentais, emocionais, fisiológicas, quando se está apaixonado”.

  • A paixão em um relacionamento tem prazo de validade?

O professor Mateus Levandowski explica que a paixão é uma fase mais intensa e importante para essa conexão inicial, mas transitória. É o que ajuda a iniciar o relacionamento e não é o que vai mantê-lo. “A paixão é marcada por essa idealização intensa do outro e as pessoas não sustentam isso por muito tempo, pois requer energia e disposição.” Em geral, essa fase dura meses ou até dois anos e com o tempo, o relacionamento vai transitando, tende a amadurecer e dar lugar para esse vínculo mais estável, como amor companheiro, outros tipos de intimidade, comprometimento, aceitação das diferenças reais do parceiro, da parceira. “Isso não significa que o sentimento se apaga, pelo contrário, ele se transforma em algo que é muito bonito, muito lindo”.

  • O que vem depois da paixão?

Para os especialistas, depois da paixão vem o relacionamento em si, aquele amor estável, baseado em afeto, intimidade, compromisso, respeito, convivência real e com as diferenças. “Quando a idealização dá lugar a relacionamento verdadeiro e puro com o par como o outro realmente é, de fato foi feita a escolha para dividir uma vida. Seja ela da forma que for, de diversos tipos de relacionamento que a gente pode caracterizar. Um deles é o amor”, considera Levandowski. “Não penso exatamente em uma etapa, mas o fim da paixão não é o fim do amor. Quando um casal deseja permanecer junto, após a paixão, é esperado que a relação esteja se transformando em um vínculo seguro, em um amor maduro”, completa Bartel.

  • Quais as características do amor?

Para o professor da UFPel, o amor envolve emoções mais profundas e relacionadas ao apego, à segurança. São todas emoções que surgem quando se está apaixonado, amando alguém. Essa experiência desperta emoções profundas e conecta-se com o outro e com a própria pessoa. “A gente consegue, quando se está amando, transcender a nós mesmos, destinar libido, energia, motivação para outro. A nossa capacidade de amar o outro, transcender as nossas vontades em prol do outro, diz muito sobre nós. Então, amar o outro é poder enxergar o outro e nós mesmos”. Diferentemente da euforia inicial, o amor envolve intimidade emocional, confiança, respeito mútuo. “É quando o par começa a lidar com a realidade do outro, com as qualidades e as imperfeições, as cicatrizes e os traumas, as vivências, e, com tudo isso, aprender a conviver. Essa etapa é mais estável, é menos impulsiva, mas obviamente muito mais profunda quando for vivida de verdade”.

  • Quando o namoro acaba é importante que o par enfrente o luto para seguir em frente?

Para Bartel, o fim de um relacionamento, como o fim de qualquer outro ciclo, exige um processo de luto emocional, pois toda a perda tem peso diferente na vida. “Normalmente o fim de um relacionamento é significativo para as pessoas envolvidas emocionalmente, sendo importante enfrentar. Reprimir pode atrasar a recuperação e fazer a gente tomar medidas emocionais comportamentais desadaptativas”, salienta. Enfrentar o luto, segundo o psicólogo, permite elaborar a perda, reorganizar os sentimentos, abrir espaço para novos e diversos vínculos no futuro, hobbies, trabalho, vida social, sejam eles íntimos, amorosos ou não.

  • Buscar ajuda profissional é importante para autoconhecimento e então conhecer um par?

Há várias formas de buscar esse autoconhecimento e ajuda profissional. A psicoterapia, com um profissional da psicologia, um profissional da psiquiatria, pode ser indicado. Esse processo de autoconhecimento, na visão dos especialistas, é uma chave para uma relação saudável. “A psicoterapia, ela pode ajudar a entender padrões repetitivos nossos, inseguranças, expectativas, favorecendo escolhas afetivas mais conscientes baseada em aspectos que de fato são importantes para mim”, define Levandowski.

Gerações da paixão e do amor

Não há idade para a paixão, em para o amor. Assim revela o casal de idosos que depois de passar um bom tempo viúvo resolver experimentar uma nova paixão. O que dizer a maturidade de dois adolescentes, que em pleno século 21 ainda fazem questão de pedir autorização aos pais para namorar. Fora das telas, a relação é construída com base no diálogo e no respeito.

Wilson Cardoso Luzardo, 76 e Doralina Bratz, 74, são de Piratini. Ele viveu o luto por 40 anos e ela, 30. Já tinham trocado olhares na juventude, mas foi em um baile que a vontade de formar um par falou mais alto. “Eu tinha horror dele”, diz a aposentada, mas confessa que se entregou à paixão. Juntos há dez anos, dizem que não há fórmula mágica, mas sim respeito, companheirismo, compreensão e diálogo. “A nossa relação flui”, define Doralina. “Tem paixão e companheirismo, que são as principais coisas para a relação”, explica o aposentado. “Somos amigos e temos amor um pelo outro, senão, não estaríamos juntos”, confessa ela.

“Acho que os namoros de hoje têm que ter mais conversa, olho no olho. Isso não existe mais. O celular está roubando os valores, o amor, o diálogo”, opina. Para o casal, no relacionamento, sempre um tem que ceder um pouco e respeitar a individualidade, as diferenças. “Porque senão a coisa não flui. Claro que eu não vou ser igual a ele e ele é igual a mim. Mas cada um tem que ceder um pouquinho”, defende o casal de idosos que ainda vivem a experiência de um segundo relacionamento.

Na outra ponta, está o casal Carolina Senna Brochi, 17, e Vinícius Soares, 19. Os jovens podem até ser da nova geração, mas pediram autorização aos pais para namorar. Para eles, estar apaixonado é: “Não querer sair de perto dela. Quando estamos longe eu sinto saudade”, diz Vinícius. “Muita saudade”, completa Carolina. O par conta que se conheciam há tempos, mas por um período pararam de conversar. “Depois de sete meses, a gente saiu pela primeira vez. Esse [encontro] de hoje é o quinto”, conta o rapaz. Questionados sobre como consideram o relacionamento deles, Carolina garante que os dois conversam sobre todos os assuntos, inclusive sobre comportamento dentro de uma relação.

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