Um dia de cada vez sem cigarro

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Um dia de cada vez sem cigarro

No Dia Mundial sem Tabaco, o Brasil registrou aumento no número de fumantes

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Um dia de cada vez sem cigarro
SMS contabiliza cerca de 18 mil tabagistas em Pelotas. (Foto: Jô Folha)

M.R, 54 anos, tem uma relação distante e um tanto estranha com o cigarro. Ela fuma eventualmente, sendo que uma carteira chega a durar três meses. O cigarro causa alívio imediato após um dia estressante e ela garante que não chega a tragar.

O anonimato é pelo estigma do que representa o tabaco na vida de uma pessoa. Uma condenação. O que na verdade não está longe de ser. No Dia Mundial sem Tabaco, 31 de maio, as notícias não foram animadoras para o país que conseguiu reduzir drasticamente os números, mas volta a apontar crescimento de fumantes entre 2023 e 2024.

Desde o início da série histórica, em 2007, o levantamento realizado pelo Ministério da Saúde apontou aumento de 9,3% para 11,6% no índice de consumidores de cigarro. O mesmo estudo indica que entre os homens o salto foi de 9,8% para 13,8%.

O fato pode ser atribuído aos cigarros com aromas e aos eletrônicos, preferidos entre os jovens. Nem mesmo para a economia brasileira o hábito de fumar é rentável, pois o Instituto Nacional de Câncer (Inca) afirma que o governo gasta R$ 5,00 com doenças ligadas ao fumo para cada R$ 1,00 lucrado pela indústria do tabaco.

Embora cidades da Zona Sul do Estado tenham forte relação entre cultivo do tabaco e a economia, as consequências para a saúde do fumante são bem mais significativas. O Inca aponta que, por dia, são 477 óbitos no país, sendo que entre as principais causas estão a Doenças Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), doenças cardíacas, diversos tipos de câncer, Acidente Vascular Cerebral (AVC), diabetes tipo 2 e fumo passivo, que pode estar relacionado a cerca de 20 mil mortes anuais.

Inca aponta que, por dia, são 477 óbitos no país causados pelo tabaco. (Foto: Jô Folha)

A mãe da estudante universitária M.R. fumava bastante e faleceu este ano após um AVC. A filha não relaciona a causa da morte ao tabaco, porém teme ficar viciada. “Um exemplo é que tirei férias e não fumei um dia sequer”, garante. Talvez ela não esteja na estatística da Secretaria Municipal de Saúde de Pelotas, que contabiliza em torno de 18 mil tabagistas identificados na Atenção Primária – levantamento feito através do Prontuário Eletrônico E-SUS/PEC.

Dentro das ações de saúde pública, o município conta com o Programa Nacional de Cessação ao Tabagismo (PNCT – vinculado ao Ministério da Saúde e ao Inca), onde oferece tratamento para o usuário que tem interesse em parar de fumar. A pessoa pode participar de grupos de cessação ao tabagismo, com distribuição de medicamentos se necessário, após avaliação profissional de forma gratuita.

A enfermeira Tamires Stifft Radtke, coordenadora da Rede Temática – Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) –, informa que o programa está disponível em algumas Unidades Básicas de Saúde, Caps AD e Telessaúde do município. “Somente no ano passado, 344 usuários procuraram o programa e foram atendidos em alguma unidade de saúde”, enfatiza a enfermeira, embora seja um número pequeno perto do universo dos 18 mil.

A profissional da saúde inclui nesse grupo os usuários de dispositivos eletrônicos. “Muitos desses acabam agravando seu estado de saúde, precisando de atendimento emergencial e prolongado”. A alternativa, para Tamires, está na educação popular, através do conhecimento frente aos malefícios do tabaco, e que a qualquer momento, a decisão de parar de fumar traz benefícios à saúde.

Uma luta constante

O médico Roni Quevedo é referência em Pelotas quando o assunto combate ao fumo. Na Universidade Católica de Pelotas (UCPel), após assumir o Programa Antitabagismo, em 2007, conseguiu apoio da reitoria e esta determinou uma portaria proibindo fumar na área interna. O “UCPel fumo zero” teve reconhecimento do Conselho Federal de Medicina. No seu trabalho em ajudar as pessoas a abandonarem o cigarro, a luta é diária e constante, até vigilante.

Crítico ferrenho à indústria do fumo, Quevedo acredita que há interesses políticos e econômicos, mas nem por isso desiste. Na segunda gestão do governo estadual de Eduardo Leite, o médico apresentou um projeto que objetiva levar o tema sobre tabagismo para a escola, mas sem avanço.

“O incentivo para a gurizada é fundamental”, defende. Até porque é uma faixa etária que está experimentando cada vez mais os dispositivos eletrônicos (vapes) que causam um tipo de doença pulmonar mais grave que os cigarros comuns.

Quevedo lembra que os fumantes passivos, os produtores de fumo e os fetos também são atingidos pelos malefícios do cigarro. “No Brasil o tabaco mata por dia sete pessoas que nunca fumaram. É uma informação pouco divulgada porque a indústria da nicotina não permite”. Embora seja uma situação complexa, é preciso sempre buscar uma saída. “Eu me preocupo com o dia 31 de maio e com o 29 de agosto (Dia Nacional de Combate ao Fumo), mas também me preocupo com o dia de hoje, de amanhã e todos os outros”.

Impacto econômico

O tabagismo tem um impacto total no SUS de R$ 153 bilhões por ano, sendo que apenas 5% desse valor é arrecadado em impostos.

O tabagismo em números

• Mais de oito milhões de mortes e doenças no mundo por ano.
• Desses, sete milhões são fumantes diretos e um milhão defumantes passivos.
• São estimados 1,25 bilhão de fumantes.
• No Brasil, cerca de 9,1% da população adulta é fumante, sendo que o tabagismo mata 477 pessoas por dia.
• Um em cada cinco adultos fumavam em 2022, em comparação com um em cada três em 2000.
• Em Pelotas são 18 mil fumantes.

Vapes

• Proibidos no Brasil desde 2009.
• Pesquisa apontou que em todas as capitais brasileiras, 2,1% da população adulta usou cigarros eletrônicos em 2023.
• Maior prevalência está entre os jovens de 18 a 24 anos, que respondem por 6,1% dos entrevistados.
• Em 2024, a Anvisa reforçou a proibição da comercialização, importação e propaganda dos DEFs, por meio da Resolução RDC nº 855/2024.

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