Fraude no INSS: quem dever proteger, facilitou

Opinião

Jarbas Tomaschewski

Jarbas Tomaschewski

Coordenador Editorial e de Projetos do A Hora do Sul

Fraude no INSS: quem dever proteger, facilitou

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O esquema que pode ter desviado R$ 6,3 bilhões de aposentadorias e pensões entre 2019 e 2024, e atravessou o último e o atual governo à frente da presidência da República, teve seu ambiente construído em cima das decisões de três órgãos que deveriam, por natureza, identificar riscos e proteger os cidadãos, mas agiram justamente no sentido contrário. A constatação vem das apurações feitas pela Polícia Federal, responsável por investigar o caso, e de levantamentos realizados pela imprensa.

Na fraude, entidades representativas dos aposentados cadastraram as vítimas sem autorização, para obter descontos mensais junto aos benefícios pagos pelo INSS.

O primeiro movimento que fragilizou o controle veio do Congresso Nacional. Em 2019, uma Medida Provisória previu a autorização anual para que as associações descontassem dos aposentados e pensionistas. Os parlamentares derrubaram a regra que exigia a autorização e garantia justamente a decisão a quem iria pagar – se aceitava ou não – como princípio para revalidar a cobrança. Se no primeiro momento o Congresso alargou o prazo para três anos, na sequência derrubou essa obrigatoriedade. Ou seja, a vítima ficou sem alternativa para, periodicamente, ser consultada e poder negar, se assim desejasse.

Um segundo cenário também poderia ter ajudado a combater o esquema. Mesmo com determinações do Tribunal de Contas da União (TCU), que assim se manifestou: “há um preocupante descontrole nesses processos, pois o INSS ainda não recepciona os termos de filiação e os termos de autorização de desconto de mensalidade associativa’, agindo o INSS em flagrante descumprimento aos normativos supracitados” -, o ministro Aroldo Cedraz permitiu a revalidação dos descontos sem a exigência de biometria ou da assinatura eletrônica, e adiou no mínimo seis vezes o julgamento de recursos sobre os descontos. Ele só voltou a apresentar o processo na sessão da última quarta-feira, após a repercussão do caso, e foi cobrado por colegas, o que levou a um bate-boca na Corte. Novamente o caminho ficou mais fácil aos fraudadores.

Por fim, o Ministério da Previdência Social reconheceu a demora para apurar as denúncias. Os primeiros alertas chegaram em 2023, quando a Controladoria Geral e o Tribunal de Contas já analisavam as suspeitas. Demitido após o escândalo, o ex-ministro Carlos Lupi admitiu a morosidade para agir. “Gostaria que fosse mais rápido, mas não foi. Mas não quer dizer que nós fomos omissos. Pode o INSS ter sido demorado, e foi”, justificou-se, sem convencer. Mesmo depois de ter sido alertado sobre os descontos não autorizados, Lupi levou quase um ano para anunciar as primeiras medidas.

Congresso, TCU e Ministério da Previdência Social. Passou pelos três a possibilidade de proteger pessoas que trabalharam uma vida inteira e todos falharam na hora de endurecer as regras e impedir a fraude que pode ter impactado nove milhões de pessoas. O resultado da omissão é o fortalecimento de algo já latente no Brasil: o aumento da descrença na política e nos governos.

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