Nos três primeiros meses do ano, o desafio diário de transitar de carro, motocicleta, bicicleta ou a pé no trânsito de Pelotas resultou em 37 acidentes com danos materiais, 143 com lesões corporais e uma morte. Os dados da Brigada Militar representam uma redução em dois tipos de ocorrências: os acidentes com pessoas feridas e fatais. No comparativo com janeiro, fevereiro e março de 2024, a queda no número de mortes foi de 75% e de acidente com lesões, 15,88%. O único indicativo com aumento de 32,47% foi o de acidente com danos materiais. Mesmo com resultados positivos, o trânsito da cidade segue sendo problemático. A prefeitura, via Secretaria Municipal de Trânsito, foi questionada sobre estatísticas e estratégias durante três dias, mas não respondeu.
Se contabilizar abril, o total de mortes no trânsito sobe para duas. Na véspera do feriadão, um motociclista de 44 anos trafegava pela avenida Adolfo Fetter e colidiu em uma haste em frente à escola Santa Mônica. Ele chegou a ser socorrido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levado ao Pronto Socorro de Pelotas, onde faleceu. Já acidentes com lesões, bem mais. Enquanto a reportagem produzia a matéria ontem, presenciou um acidente entre carro e moto. A motorista trafegava pela rua Sete de Setembro e quando chegou na Anchieta, que é preferencial, não avistou o motociclista. Ao avançar, atingiu a vítima.
Tem solução?
Pelas estatísticas, é fácil de entender os mais de 143 acidentes com lesões do trimestre. Basta ficar alguns minutos em pontos com maior fluxo de veículos e de pedestres para perceber os riscos que as pessoas se submetem, ou pela pressa, ou por não respeitar a sinalização de trânsito que, por vezes, confundem motoristas e pedestres. Na manhã de ontem, por exemplo, uma idosa atravessou na faixa de segurança, na rua General Osório com Voluntários da Pátria, porém o local tem sinaleira e estava fechada para pedestres. Ela quase foi atingida por um ônibus.
O artigo 70 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) diz que os pedestres que estiverem atravessando a via sobre as faixas delimitadas para esse fim terão prioridade de passagem, exceto nos locais com sinalização semafórica, onde deverão ser respeitadas as disposições deste Código. Caso este não tenha concluído a travessia e o sinal abrir, os motoristas devem dar preferência ao pedestre. Mas será que esta senhora foi educada para tal regra? A educação no trânsito é fundamental e, por meio dela, o professor titular e coordenador da Engenharia de Transporte e Mobilidade (Cetmob) da UFPel, Fábio Rocha, acredita que seja possível um trânsito mais seguro no Brasil.
“A alternativa passa por um conjunto de ações e medidas que envolvem a educação, a infraestrutura e o cumprimento das leis de trânsito. A chave para a mudança está na combinação de atitudes responsáveis dos condutores, pedestres e ciclistas, com a implementação de políticas públicas eficazes”, aponta. Para o professor, a educação começa na família e passa pela escola, duas instituições centrais para a mudança de comportamento. “Mas insisto, esse quadro faz parte de algo muito maior: o relativismo frente ao cumprimento de regras”.
Instinto
Um outro ponto crítico observado pela reportagem é a rótula da avenida Domingos de Almeida com São Francisco de Paula. Nela há duas faixas de segurança para quem vai em direção à avenida Ferreira Viana. Alguns motoristas consultados dizem que temem parar para o pedestre por causa do fluxo da rotatória, situação que causou um atropelamento no início do mês. “Esse é um problema real e comum. A solução reside na priorização dos pedestres e na adoção de medidas para garantir a segurança de todos”, destaca o professor. Rocha ressalta novamente que é uma questão de educação e que o CTB estabelece que os pedestres têm prioridade sobre os veículos, ou seja, o condutor deve parar e ceder a passagem ao pedestre, mesmo impactando o fluxo.
“A hesitação em parar para o pedestre, por medo de ser atingido por outro veículo, é uma atitude perigosa. O condutor deve estar atento à presença do pedestre na faixa e estar preparado para parar, mesmo que isso implique na aproximação de um veículo”, explica o professor. Mas ele enfatiza que as regras são relativizadas. Exemplo: a senhora da faixa pode não saber as regras do CTB, mas não tem como admitir um motorista habilitado desconhecer o código. O coordenador do Cetmob conta que há ações previstas na área de educação para o trânsito no âmbito escolar na região da grande Porto Alegre. “As ações podem incluir campanhas de conscientização, cursos de direção defensiva e palestras sobre o CTB”, esclarece.