Mitos e verdades sobre o autismo

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Mitos e verdades sobre o autismo

Semana é de orientações e luta contra estereótipos e preconceitos quanto a condição

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Mitos e verdades sobre o autismo
Claudete e Gustavo destacam a sua resiliência. (Foto: Jô Folha)

Ao contrário do que muitos podem pensar, o autismo não é uma doença. Na verdade, o psicólogo Adriano Moura explica que o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por dificuldades na comunicação social, interação social e comportamentos repetitivos, conforme o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).

A neuropediatra Dra. Juliana Maia complementa que o TEA é um transtorno complexo, no qual se observa “movimentos repetitivos e estereotipados, além de um comportamento muito rígido e, em muitos casos, atraso na comunicação e na fala”. Segundo ela, o termo “espectro” pode ser comparado à luz, que apresenta diversas cores. Assim, o autismo se manifesta de maneiras diferentes em cada indivíduo: há aqueles que desenvolvem fala avançada, enquanto outros não falam ou apenas repetem palavras; alguns interagem com outras pessoas, mas apresentam dificuldades na qualidade dessas interações, enquanto outros evitam completamente o contato social.

Por isso, o DSM-5 apresenta o autismo com três níveis de suporte, de acordo com a necessidade de assistência no dia a dia:

  • Nível 1: Necessita de pouco apoio.
  • Nível 2: Necessita de apoio moderado.
  • Nível 3: Necessita de apoio substancial.

Para 2027, o Ministério da Saúde prevê a implementação da 11ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11) pela Organização Mundial da Saúde (OMS), eliminando esses níveis. A CID-11 propõe uma subdivisão baseada nas características funcionais dos indivíduos, classificando o TEA em:

  • TEA com prejuízo intelectual associado: Indivíduos que apresentam déficits intelectuais concomitantes.
  • TEA com prejuízo funcional severo: Casos em que há limitações mais graves nas habilidades de comunicação, interação social ou autonomia.
  • TEA sem prejuízo intelectual ou funcional significativo: Indivíduos com habilidades cognitivas e funcionais próximas da média, mas que ainda enfrentam desafios relacionados ao espectro.

Essa mudança busca tornar o diagnóstico mais inclusivo e facilitar o acesso aos serviços de saúde.

Aumento nos diagnósticos e importância da detecção precoce

Estima-se que 2 milhões de brasileiros estejam dentro do espectro. Em Pelotas, a presidente da Associação de Amigos, Mães e Pais de Autistas (Amparho), Eliane Bittencourt, estima, a partir dos atendimentos realizados, que existam mais de cinco mil autistas na cidade. Esses números, no entanto, não são oficiais, já que não há um levantamento formal sobre a quantidade exata de autistas na população.

Os diagnósticos de autismo aumentaram significativamente nos últimos anos. A Dra. Juliana explica que isso não significa necessariamente um crescimento na incidência do transtorno, mas sim uma maior conscientização e aprimoramento dos critérios diagnósticos. “Hoje temos muito mais informação e um olhar mais atento dos pediatras, médicos, professores e pais. Isso faz com que o diagnóstico seja feito mais cedo”, afirma.

O diagnóstico precoce é fundamental para o desenvolvimento da criança. “Quanto mais cedo identificamos os sinais do autismo, maiores são as chances de estimular o cérebro, que nos primeiros anos de vida apresenta uma plasticidade maior. Isso melhora o prognóstico e pode permitir que a criança desenvolva mais autonomia no futuro”, explica a neuropediatra. Segundo ela, o ideal é que a identificação ocorra antes dos dois anos, possibilitando a implementação imediata de terapias específicas, como fonoaudiologia, terapia ocupacional e acompanhamento psicológico.

Diagnóstico e primeiros passos

O diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode ser um marco significativo na vida de famílias que convivem com o espectro. Identificar os sinais e buscar ajuda especializada é um processo que demanda esforço e resiliência.

Claudete Vasconcelos destacou que percebeu algo diferente no comportamento de Gustavo, hoje com 16 anos, ainda nos primeiros anos de vida. “Ele era muito quietinho, não falava, não interagia. Levei em vários médicos, mas na época, diziam que era normal. Só quando ele começou a escola e chorava muito, foi que iniciamos a busca por psicólogos e outros profissionais até obter o diagnóstico”, relembra. Segundo ela, o diagnóstico foi recebido com alívio, pois trouxe clareza e a oportunidade de procurar tratamentos adequados. No entanto, a família ainda enfrenta desafios, como a falta de profissionais especializados em determinadas áreas, como fonoaudiologia.

Já Roger Porto enfatizou a dificuldade na busca por especialistas, como neurologistas infantis, para confirmar o diagnóstico de seu filho. Ele afirma que a confirmação trouxe impacto à família, pois implica em reorganizar perspectivas sobre autonomia e inclusão social do filho. “Você começa a pensar em como será o futuro, como lidar com a liberdade e a independência deles”.

Bianca Silveira, neuropsicóloga clínica, explica que o diagnóstico do TEA requer uma avaliação abrangente, baseada em critérios do DSM-5 ou CID-11. O processo envolve observar comportamentos, o histórico de desenvolvimento e utilizar testes específicos. Ela reforça a importância do diagnóstico precoce, que possibilita intervenções mais eficazes. “Quanto mais cedo o diagnóstico, mais estratégias podem ser implementadas para desenvolver habilidades sociais, de comunicação e adaptação”, afirma Bianca.

Após o diagnóstico, os primeiros passos recomendados incluem:

  • Buscar informações: conhecer mais sobre o TEA ajuda os familiares a entenderem melhor as características e necessidades da criança.
  • Consultar profissionais especializados: psicólogos, terapeutas ocupacionais e pedagogos podem elaborar planos de intervenção adaptados.
  • Iniciar intervenções precoces: trabalhar habilidades sociais, comunicacionais e comportamentais por meio de terapias indicadas.
  • Criar um ambiente estruturado: estabelecer rotinas e garantir um ambiente previsível e seguro.
  • Participar de grupos de apoio: compartilhar experiências com outras famílias pode ser valioso.
  • Cuidar do bem-estar familiar: priorizar o autocuidado dos cuidadores é essencial para lidar com os desafios diários.

Educação e vida adulta

Uma educação verdadeiramente inclusiva requer métodos específicos e adaptados para atender às necessidades dos alunos autistas. De acordo com Síglia Camargo, professora e pesquisadora em educação inclusiva, o Desenho Universal da Aprendizagem (DUA) é uma abordagem eficiente para alcançar a diversidade na sala de aula. “O professor pode abordar um determinado conteúdo de diversas formas, utilizando recursos variados e permitindo que os alunos expressem seus conhecimentos de maneiras diferentes”, explicou Síglia, enfatizando a importância do ensino estruturado e de recursos visuais para facilitar a rotina escolar e prevenir crises.

Além disso, o Plano Educacional Individualizado (PEI), homologado em 2024 pelo Ministério da Educação, tem sido um importante instrumento de planejamento. “O PEI estabelece objetivos e metas de aprendizagem, considerando o que o aluno já sabe e o que necessita aprender”, detalhou a professora.

No mercado de trabalho, os desafios de inclusão persistem, mas avanços são percebidos. Inácio Maron, autista e mestrando em Políticas Públicas, contou que pausas frequentes durante suas tarefas são essenciais para lidar com o estresse. “Descanso bastante entre minhas tarefas e faço pausas enquanto estou estudando”, afirmou. Já Fábio Cossio, jornalista e ativista, destacou a necessidade de maior conscientização empresarial. “Ainda há necessidade de mais capacitação dos gestores para que as empresas estejam efetivamente comprometidas com a inclusão”, pontuou.

Mitos e verdades

  1. Autismo é uma doença que pode ser “curada”? O autismo não é uma doença, mas uma condição que acompanha a pessoa ao longo de toda a vida. Embora não seja “curável,” é possível que indivíduos desenvolvam habilidades através de tratamentos e terapias adequadas.
  2. Todos os autistas têm “superpoderes”? Embora algumas pessoas com autismo possam apresentar altas habilidades, isso não é uma regra. Em muitos casos, o que se observa é o hiperfoco, um interesse intenso por determinado tema ou objeto.
  3. Pessoas autistas não sentem emoções? Indivíduos com TEA sentem emoções como qualquer outra pessoa, mas podem apresentar dificuldades em expressá-las. A identificação de formas alternativas de comunicação, como gestos ou olhares, é essencial para compreender suas emoções.
  4. Vacinas causam autismo? A ciência já confirmou que não há relação entre vacinas e autismo. Renata enfatiza a importância de buscar informações confiáveis e evitar a desinformação sobre as causas do TEA.

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