Em 15 de março de 2013 a publicação da Lei 12.734 era celebrada por prefeitos e prefeitas do Brasil. A norma mudava a distribuição dos royalties do petróleo entre os municípios, tornando-a mais equilibrada no cenário federativo. Um reforço e tanto às finanças públicas se desenhava. A alegria, porém, durou quase nada. Em decisão isolada (monocrática) três dias depois, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), invalidou a nova lei aprovada pelo Congresso. Posicionamento que barrou R$ 89 bilhões de investimentos abrangentes no país até 2023, em saúde, educação, segurança, infraestrutura e outras áreas estratégicas.
A Lei dos Royalties foi uma reação à desigualdade financeira entre os entes. Reduzia a participação da União na divisão dos lucros e ampliava a de estados e municípios não produtores, partindo do princípio de que o petróleo é do Brasil e não de uma minoria. O governo federal deixava de receber 30% do total dos royalties para ficar com 20%. O percentual dos estados produtores caía de 26,25% para 20%, enquanto o dos municípios confrontantes de 26,25% para 15%. Já estados e municípios não produtores subiam suas participações de 7% e 1,75%, respectivamente, para 21%.
A liminar concedida pela ministra Carmem Lúcia atendeu a Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) apresentadas por aqueles que não abriram mão da maior fatia do bolo. Com o STF em silêncio há mais de uma década, a distribuição da compensação financeira paga por empresas pelo uso de recursos não renováveis segue até hoje uma relação injusta.
A Confederação Nacional de Municípios (CNM) é o Robin Hood dessa história e luta para que os ministros agendem o debate do tema. Ano após ano a entidade bate à porta do Supremo e cobra o fim da espera, que estranhamente segue engavetado e impede o ingresso de novas receitas à maioria das unidades da federação. A tentativa mais recente aconteceu no último dia 26, quando a CNM participou de audiência no gabinete do presidente do STF, ministro Luís Eduardo Barroso, e voltou a pedir a definição de um cronograma pelo Núcleo de Solução Consensual de Conflitos (Nusol) da Corte.
O fato é que, 12 anos depois, a realidade da maioria dos municípios seria outra se a Lei 12.734 estivesse em vigor. É óbvio que quem tem a “galinha dos ovos de ouro” no seu quintal não deseja compartilhá-la, tampouco tem interesse em discutir compensações. Por outro lado, há a necessidade de se refletir a busca pelo equilíbrio do rateio dos lucros, como fizeram à época os congressistas, apesar dos vetos parciais da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que também não aceitou uma partilha mais igualitária e a redistribuição dos contratos já em vigor – e pagou com a derrubada de seus vetos na sequência.
Para se ter uma ideia do quanto isso representa, levantamento da Confederação em 2013 indicou ganhos ao Rio Grande do Sul na ordem de R$ 505,8 milhões – seriam R$ 123,1 milhões para o Estado e R$ 382,7 milhões aos municípios. Enquanto em 2011, antes da mudança, os gaúchos receberam R$ 123,7 milhões de royalties. Apenas Pelotas teria mais de R$ 3 milhões com a alteração. Até hoje, portanto, valores acima de R$ 33 milhões deixaram de ingressar nos cofres do município. Tudo porque o voto de uma única ministra do STF sepultou, 12 anos atrás, a decisão de um Parlamento inteiro.
Se na campanha nacionalista da década de 1940 o Brasil gritava “O petróleo é nosso”, nas discussões de um modelo exploratório ainda incipiente, hoje o melhor slogan para definir o cenário da partilha é “O petróleo é de poucos”. Os poucos que ganham muito e os muitos que ganham pouco.