Ninguém muda quando vê a cor da pele como critério de excelência e justifica-se para argumentar o mais odioso dos preconceitos humanos. Superioridade, capacidade intelectual, beleza, aptidão, valores. A lista é grande e ainda que cada uma delas possa ser desconstruída num estalar de dedos, na mente destas pessoas sempre haverá outro motivo para permanecerem inabaláveis na postura de divisores sociais pela cor da pele. Racistas são sempre racistas.
O caso envolvendo o estudante universitário da UFPel, que gravou um motorista de ônibus da instituição e compartilhou a imagem, o que gerou comentários a respeito da música tocada no interior do veículo (“música de preto”), é o reflexo de um dia normal na rotina de Pelotas. Não é preciso escutar ou ler comentários para saber que ainda temos um longo caminho a percorrer e muitas barreiras para serem derrubadas. Preocupa mesmo é identificar gente no início da vida já mergulhada em tal abjeção.
Coincidentemente, no segundo mês em que o município passou a contar com um vice-reitor e uma vice-prefeita negros, e uma Secretaria de Igualdade Racial – conquistas inéditas -, somos notícia pelo preconceito. Com um torcedor que faz gestos de macaco no clássico Bra-Pel ou com postagens nas redes sociais, ambiente em que qualquer indivíduo se esconde, opina sobre tudo e, se a repercussão é negativa, apaga os comentários e finge ter sido um mal-entendido, sem compromisso com a consequência de seus atos.
O município mais negro do Rio Grande do Sul tem dificuldade de mudar e tirar lições de erros recorrentes. Novos episódios vão acontecer, talvez ainda hoje em algum ponto da cidade. Muitos sem denúncias ou conhecimento público. Com crianças, jovens, adultos e idosos. Não é preciso proferir palavras para revelar o preconceito. As vítimas sabem. A intolerância está no olhar, no gesto, na atitude, na omissão do silêncio.
Pelotas deveria despertar com os episódios que se sucedem. Notas de repúdio são importantes, mas quantas ficam no portão de casa, enquanto da calçada para a rua o problema continua? Necessitamos bem mais de uma semana de discussões em novembro. Precisamos de 365 dias de alertas, diálogos, educação e política antirracistas. Atacar a discriminação sistêmica, estrutural, interpessoal, habitacional, institucional. E mirar, principalmente, a nova geração. Será ela a responsável por promover mudanças fundamentais.
Não existe ex-racista. Poderá existir um novo racista. E este é possível conscientizar com ações diretas no berço, para que não cresça torto.