São milhares de anos de evolução e o sono ainda faz parte da humanidade. Dormimos por pelo menos um terço da vida. Para especialistas, o recurso fisiológico é essencial e insubstituível, pois faz parte dos processos bioquímicos que acontecem no organismo dentro do ciclo circadiano.
Mas nem todos alcançam a plenitude de uma noite bem dormida e estudos apontam que, após a pandemia, quase um terço da população brasileira passou a enfrentar dificuldades. Higienizar o sono é uma das práticas cada vez mais presentes na rotina das pessoas que buscam qualidade de vida.
O neurologista Pablo Silva, da Neural, diz que o termo de higiene do sono é bastante divulgado e que a maioria das pessoas, quando vai consultar, já aplica algum método. “São hábitos que adotamos para ter uma melhor noite de sono possível e que se iniciam durante o dia”, indica o neurologista.
Ele explica que o sol dita o horário de dormir, pois o cérebro se ativa em algumas fases e relaxa em outras. “Nossos órgãos fazem processos químicos que a gente não consegue fazer durante a vigília. Então, dormir é insubstituível. Não existe remédio, não existe suplemento, não existe nenhum tipo de comportamento que vá substituir o sono”, enfatiza.
Para quem ainda não se identificou nessas condições, mas está com dificuldades para dormir, o doutor Pablo Silva aponta algumas práticas de higienização do sono:
Hora de acordar
Um hábito fundamental do sono é ter um horário para acordar, sendo este o mais importante que o de dormir. “É comum as pessoas desrespeitarem esse horário de acordar no final de semana, sendo que a consequência é iniciar uma semana desregulada, podendo levar dois ou três dias até atingir a rotina”, alerta o médico.
Cochilos
Evitar cochilos depois do almoço, principalmente pessoas mais velhas. O limite indicado é algo entre 20 e 30 minutos, pois se passar disso, pode prejudicar o sono da noite.
Estimulantes
Café, chimarrão, energético, principalmente depois das 15h ou 16h, devem ser evitados, dependendo do horário que a pessoa for dormir. O hábito de tomar chimarrão à tardinha pode prejudicar bastante a qualidade do sono, pois não aprofunda o sono até a fase REM, que é necessária. No caso do café, o uso do descafeinado pode resolver a questão do hábito de tomar a bebida à noite.
Leitura
A melhor atividade antes de dormir é a leitura. “Ao som de uma música tranquila e após um banho quente relaxante, é um ótimo horário para ler”, diz o especialista. Pablo ressalta que resolver problemas ou trabalhar vai prejudicar o sono e se lembrar de algo importante, anote e deixe para resolver no outro dia, porque tudo vai tirar a qualidade do sono.
20 minutos
Há pessoas que se deitam sem sono, na esperança de que ele venha. Para o neurologista essa não é uma boa prática. “Se 20 ou 30 minutos depois de deitar-se não dormir, levante-se, vá para outro ambiente e espere o sono chegar”, indica. No quarto, nada de led, luz bem fraca e o ambiente deve ser 100% silencioso.
“A cama deve ser interpretada pelo nosso cérebro como um lugar que a pessoa vai dormir”.
Horas de sono versus idade
Quanto mais idade, menos sono. Já ouviram falar sobre isso. Para o doutor Pablo Silva, esta é uma questão muito complexa, pois o ideal é dormir sete horas em todas as idades. Com o tempo, segundo o especialista, a necessidade de sono realmente diminui e as características do sono mudam.
Uma criança recém-nascida dorme mais de 15 horas, pode chegar a 17 horas de sono. Uma mais jovem tem uma necessidade de dez horas; um adolescente nove ou dez horas.
Na idade adulta, essa média é de sete ou oito horas. Com o idoso de seis a sete horas.
“As pessoas têm a sua individualidade. Então temos um grupo de pessoas que são os dormidores curtos e tem os dormidores grandes. O que faz a gente saber se a pessoa precisa das sete horas é a satisfação que ela tem ao acordar, se ela não tem sintomas diurnos, provavelmente biologicamente ela está ajustada para ter um sono mais curto.”
Quase um século de atenção
O estudo do sono teve início entre as décadas de 1930 e 1940 em Chicago. O Brasil seguiu a tendência, principalmente o uso de tecnologias para entender melhor o hábito. “A polissonografia é o principal exame que monitora o sono.
A partir de então já são várias as pesquisas, sendo que o país está um dos maiores centros de pesquisa do mundo e referência nesse tema”, destaca. Uma delas é na área da apneia do sono, que antigamente se pensava atingir de 4% a 5% da população e hoje são 35%, segundo a Associação Brasileira do Sono.
Diagnóstico
A apneia do sono é um colapso da via aérea superior durante o dormir. Durante as fases profundas do sono, o REM (Rapid Eye Movement, que significa movimento rápido dos olhos), ocorre maior relaxamento do corpo (flacidez muscular) e a via aérea estreita e obstrui com a passagem do ar, como consequência há uma interrupção da respiração.
Quando a sequência foi maior que 10 segundos se tem a apneia. Segundo o neurologista, o ronco é um sinal dessa flacidez muscular da faringe que vibra e quando ela se torna mais intensa evolui para apneia.
Se a pessoa passa a noite colapsando e baixando a oxigenação, o organismo envia um sinal de alerta para a pessoa micro despertar, passando para fases mais superficiais.
“Esse quadro faz o coração acelerar, os órgãos entram no sistema despertar e ele começa a criar um estado inflamatório no organismo, porque a gente fica acordando ou micro despertando várias vezes por noite”, explica.
Consequentemente, esse sistema adrenérgico vai aumentar a frequência cardíaca, a pressão arterial e criar um estado inflamatório com aumento de níveis de açúcar. A apneia ainda está relacionada diretamente com risco para AVC em todos os seus mecanismos.
Consequências
O cérebro precisa entrar em processo de standby para reprogramar a memória. Quando isso não ocorre, explica o especialista, no dia seguinte a pessoa estará mais desatenta, com sonolência excessiva diurna. “Isso aumenta em 30% o risco de ter acidente de trânsito e de trabalho”, alerta.
Ele observa que pela prevalência da apneia na população, o tema é ainda pouco debatido. Pablo Silva diz que a proposta da Neural, clínica do sono que passou a funcionar em Pelotas, é propagar a informação.
Na Neural, o CPAP – pequeno aparelho compressor de ar silencioso, utilizado no tratamento para apneia do sono, do tipo obstrutiva – é considerado padrão no tratamento da apneia do sono para casos mais leves.
Há ainda aplicação de aparelhos intraoral feitos por dentista, exercícios de tonificação do palato da boca, fonoaudióloga e alguns tratamentos não invasivos da faringe para tentar minimizar em casos mais leves ou nos casos que o paciente não tolera o uso do CPAP.
Existem quatro tipos de aparelhos de polissonografia que detecta alguma alteração, e é uma das alternativas utilizadas pela Neural, segundo o fisioterapeuta Maicon Cleff, que atua na orientação e cuidados com o sono. “Tem como fazer a polissonografia domiciliar, quando a pessoa dorme em casa e, em alguns casos, precisa ser na clínica, que é a laboratorial”, explica.
Para ficar alerta
A higiene do sono é um conjunto de hábitos que visam melhorar a qualidade do sono, o que contribui para a saúde física e mental.
Algumas dicas para uma boa higiene do sono são:
• Ter um horário regular para dormir e acordar
• Evitar o uso de eletrônicos/ telas antes de dormir
• Não consumir bebidas estimulantes, como café, chá preto, refrigerante, chocolate, bebidas energéticas, entre outros, antes de dormir
• Evitar o consumo de álcool antes de dormir
• Evitar atividades físicas intensas antes de dormir
• Evitar comer muito antes de dormir
• Evitar o uso de medicamentos para insônia sem orientação médica
• Manter o quarto escuro, calmo, bem-ventilado e com temperatura agradável
• Verificar se o colchão e o travesseiro são confortáveis