Decreto de armas não irá impactar nas forças de segurança do RS

Polêmica

Decreto de armas não irá impactar nas forças de segurança do RS

Para analista, medida tem foco político e não prático para frear onda de violência

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Atualizado domingo,
29 de Dezembro de 2024 às 18:08

Decreto de armas não irá impactar nas forças de segurança do RS
No Estado, não há previsão de mudanças significativas na atuação. (Foto: Divulgação)

O decreto 12.341/2024, assinado pelo presidente Lula Inácio Lula da Silva (PT) e publicado no dia 24 de dezembro delimitando o emprego de armas em ações policiais, ainda tem 90 dias para ser regulamentado, mas já causa polêmica. Três governadores e uma ala de parlamentares são contra a medida que estabelece que a arma seja o último recurso, diretriz que já está embasada na Portaria Interministerial 4.226, de 2010 e na Lei 13.060/ 2014. No Rio Grande do Sul, a Secretaria de Segurança Pública adianta que a normativa não implica em alterações nos procedimentos das corporações, pois elas já são empregadas.

Pela polêmica gerada, o ministro da Justiça e Segurança, Ricardo Lewandowski, anunciou em entrevista que deve antecipar para janeiro a regulamentação do decreto. Já o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, afirma que a medida não busca dificultar o enfrentamento à criminalidade no Brasil e sim que armas só poderão ser usadas quando outros recursos de “menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos”.

O texto também prevê que as ações policiais não deverão discriminar pessoas em razão da cor, raça, etnia, orientação sexual, idioma, religião e opinião política. A pasta ainda prevê treinamento para os profissionais de segurança pública. O monitoramento do cumprimento das medidas será feito pelo Comitê Nacional de Monitoramento do Uso da Força, colegiado que será criado para fiscalizar a implementação do decreto.

Nada muda no RS

Em nota, a SSP diz que as medidas que são colocadas no decreto já são aplicadas nos procedimentos operacionais das forças de segurança do Rio Grande do Sul, o que não irá gerar nenhum impacto na formação de policiais, além da manutenção das orientações para ações estratégicas nas ruas.

Análise

O professor do Programa de Pós-Graduação em Política Social e Direitos Humanos da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), Aknaton Souza, considera essa alteração mais como um efeito político, pelo fim, do que prático, porque a realidade das ações policiais transcende a questão legal. “Quando nós vemos abusos, eventuais violências, violações de direitos humanos, práticas de tortura e outras formas de crueldade, isso não ocorre porque a lei permite ou proíbe”, observa.

O que é questionável, segundo o especialista, é publicar um decreto no final de 2024, regulando uma legislação já existente e que em tese deveria estar sendo cumprida. “A Lei de 2014 já estabelecia uma recepção de diretrizes normativas internacionais sobre o controle da violência estatal e da violência policial, sobretudo nessa tensão que há entre o uso da polícia pelos governadores”, analisa.

Para o professor, essa prática deveria ter sido regulada há muito tempo. “Trata-se de convenções internacionais que o Brasil é signatário e, portanto, vem desrespeitando historicamente. O país já é condenado, internacionalmente, por violações de direitos humanos, sobretudo em relação à questão policial”, cita o especialista.

Tema complexo

Na prática, Souza reforça que o decreto não terá efeito sobre as ações policiais, porque o tema é bem mais complexo, se aprofundado. “Envolve a legitimidade da prática policial e a tolerância que há pelas instituições de segurança e instituições judiciárias, como o Ministro Público, o Poder Judiciário, que muitas vezes é condescendente com a prática da violência, como revelam diversas pesquisas”. O movimento político, na opinião do especialista, é importante, mas não ao ponto de mudar a cultura da violência.

Indicadores

O decreto foi publicado no dia em que uma jovem de 26 anos foi alvejada por policiais rodoviários federais, no Rio de Janeiro, após confundirem o veículo com o de bandidos. Um estudo publicado pela Rede de Observatórios da Segurança mostra que 4.025 pessoas foram mortas por policiais no Brasil em 2023. Em 3.169 desses casos foram disponibilizados os dados de raça e cor: 2.782 das vítimas eram pessoas negras, o que representa 87,8%.

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