Após 12 anos no governo de Pelotas, primeiro como vice-prefeita e depois como prefeita por dois mandatos, Paula Mascarenhas (PSDB) chega à reta final de sua gestão. Em entrevista ao A Hora do Sul, Paula faz um balanço de seu trabalho, relembra a influência de Bernardo de Souza e fala dos planos para o futuro na política.
Qual o balanço após 12 anos na prefeitura?
Temos um legado muito forte, são 12 anos de muito trabalho, de entregas, e é um legado que vou defender muito, sempre, com muito orgulho. Vivenciamos uma transformação muito grande na infraestrutura da cidade, novas avenidas, pavimentação nos bairros, iluminação em led em toda a cidade, regularização fundiária como nunca se viu, construção de escolas, início da implantação do turno integral, reforma de todas as escolas de educação infantil, licitação do transporte coletivo, estímulo às agroindústrias, fortalecimento da diversidade cultural da cidade. Isso para dar um panorama geral.
A construção de um programa que tornou Pelotas referência internacional em segurança pública, que é o Pacto Pelotas pela Paz. São muitas entregas que temos ao longo desses anos, que é um legado que vai ser reconhecido cada vez mais pela população. Ao mesmo tempo, é o governo que enfrentou as maiores crises da história recente do município. Começamos o segundo mandato com uma pandemia e encerramos com a maior enchente da história, tivemos ciclones e estiagens, e isso deixa um legado de como fazer o enfrentamento, de organização interinstitucional, do qual me orgulho muito. Algo que a gente deixa é uma nova forma de relação do poder público com a sociedade, uma relação mais próxima.
O que gostaria de ter feito e que não conseguiu fazer?
Tem muitas coisas que eu gostaria de fazer e não fiz. Talvez a principal seja poder ter uma administração mais eficiente e que entregasse mais, sobretudo na questão da zeladoria. Gostaria de ter universalizado o tratamento de esgoto na cidade, isso eu dizia lá na campanha de 2016, e hoje nós vamos mais do que dobrar. São oito anos que levamos para tirar de 18% e elevar para 40%, quando em cinco anos talvez pudéssemos ter levado a 100% numa parceria público-privada que não conseguimos fazer.
Também gostaria de ter recursos para poder tornar a vida das pessoas mais fácil, especialmente nas periferias, onde não tem a infraestrutura adequada. É uma frustração contingencial, não havia como fazer diferente. A administração de Pelotas é muito cara, as despesas são muito altas, e as receitas, que vêm crescendo, mesmo assim, não acompanham a velocidade das despesas.
Qual foi a maior conquista e o legado que quer deixar?
Não tem como não falar no Pacto Pelotas pela Paz. Em tudo que ele produziu diretamente, que é a preservação de vidas e transformação de vidas, que tem desde oportunidades para jovens, uma nova perspectiva de vida para ex-apenados, crianças e famílias que passaram a ter mais harmonia. Para além disso, um outro legado vinculado ao Pacto é o trabalho intersetorial e interinstitucional, que se revelou fundamental no enfrentamento das crises, tanto na pandemia quanto nas enchentes.
Qual é a avaliação do cenário político e do PSDB?
Nunca uma vitória ou uma derrota são explicadas por um único fator. Um deles é o tempo, o PSDB está há 12 anos no poder, mas nosso grupo político está há 20 anos, entrou com o Bernardo de Souza, e isso causa naturalmente um cansaço na população, as pessoas gostam de mudança. Nós soubemos nos renovar, conseguimos nos manter pela aposta em nomes novos, e nossa proposta era de uma renovação com o Fernando Estima. Tem o peso desses 20 anos. Apesar das entregas, as pessoas se acostumaram com essas entregas e o novo ritmo da prefeitura.
Outro aspecto é que tínhamos um candidato natural do PSDB, o deputado Daniel Trzeciak, por ser um político que estava mais em evidência. O Daniel optou por não ser candidato e levou um tempo para isso, o que nos deixou pouco tempo para formar uma nova liderança. Apostamos no Estima por reconhecer nele um grande gestor. Num momento em que havia esse cansaço, com pouco tempo de campanha, e além disso estamos enfrentando dificuldade financeira já há algum tempo.
Junto com dificuldades climáticas, a zeladoria, que já é difícil por natureza, se complicou ainda mais, porque além da enchente, recebemos recursos federais e estaduais que nos permitiriam dar uma resposta, mas não conseguimos porque 60% dos dias foram de chuva, em que a gente não conseguia trabalhar nas ruas, então a zeladoria foi um problema na eleição, o que criou um cenário muito difícil para o PSDB. A alternância de poder é saudável e pode ser positiva, inclusive para nosso grupo político, porque esse distanciamento vai fazer a população reconhecer aquilo que nós fizemos.
Como surgiu seu interesse pela política?
Sempre gostei de discutir política, mas o envolvimento mais direto ocorreu em 1998, quando conheci o Bernardo e fiquei muito encantada com ele. Ele concorria a deputado estadual e eu ajudei na campanha. Acabei indo com uma amiga na abertura do comitê do Bernardo. Assisti um monte de discursos políticos chatíssimos, como são normalmente, até que o Bernardo discursou e eu fiquei estarrecida, foi um discurso que falou de literatura, de felicidade, de coisas que me interessavam como professora de literatura e cidadã. Me envolvi naquela campanha e ele me convidou para trabalhar com ele na Assembleia em 1999, eu tinha 29 anos.
Em 2005 me tornei chefe de gabinete dele prefeito até que ele teve que renunciar por doença e voltei para a universidade. Nesse ano que estive na prefeitura, conheci o Eduardo Leite e criamos uma relação de respeito. Nos reencontramos muitos anos depois, ele já presidente da Câmara, quando eu estava fazendo doutorado na França, me disse ‘vou ser candidato a prefeito, meu sonho é que tu sejas minha vice’. Aquilo me injetou de novo o vírus da política, e quando voltei me reaproximei do meu partido, que era o PPS e que estava à procura de um pré-candidato. Virei candidata e acabei me tornando vice do Eduardo. A partir daí, a história mais recente o pessoal conhece.
Como vê o desafio de ser mulher na política?
Sem dúvida nenhuma, é mais difícil para a mulher na política. Acho que tive um papel de mostrar que é possível, que é um lugar natural. Vêm muitas crianças de escolas aqui e as meninas falam ‘eu quero ser prefeita’. Não é só pelo meu papel, mas é muito bom para as crianças verem uma mulher aqui, e fico muito feliz que agora é uma vice mulher negra, porque as meninas negras também vão olhar para esse espaço de poder e ver que é delas também.
Essa simbologia é muito poderosa. Nunca ficou muito evidente para mim na hora dos embates que era por eu ser mulher, porque eu sou um pouco ‘faca na bota’, se a pessoa vem agressiva eu reajo também. Eu enfrentei tantas dificuldades de relacionamento que se eu fosse homem acho que seria diferente.
O governador já afirmou que terá um espaço para a senhora no governo. Qual é o caminho a partir de 1º de janeiro?
Não está definido. O governador disse que gostaria que eu fizesse parte do time dele, é natural e temos muita afinidade política. Quero muito ajudar, não sei ainda onde vou ajudar e não há definição nenhuma ainda. Seja onde for, vou procurar fazer o melhor para ajudar o Estado.
Em 2026, pretende disputar a eleição?
Tenho uma predisposição de me candidatar, porque gosto da política. Tem um momento que a gente tem que encerrar uma carreira política, acho que ainda não está no fim a minha vida política. A que cargo, não sei e hoje é impossível dizer isso. A vida pública é muito dinâmica, e tudo vai depender das contingências.
Qual é o seu sonho?
É difícil de dizer, eu gosto do Executivo. Daqui dois anos, para o Executivo só tem cargo para governadora do Estado, vice-governadora ou presidente da República, e nenhum desses cargos é a pessoa que decide, mesmo os cargos de deputado ou senador dependem do partido aprovar e de uma conjuntura.
Hoje temos um deputado federal, que é o Daniel, e não tem o menor sentido ter dois candidatos a deputado federal no mesmo partido, na mesma cidade, então as coisas apontam mais para uma candidatura a deputada estadual. É possível que isso aconteça, mas tudo é uma questão de construção, até lá tudo pode mudar.