O pesquisador João Carlos Costa Gomes, 72 anos, é chefe da Estação Experimental Cascata da Embrapa Clima Temperado, que há 25 anos foca em soluções tecnológicas para a base científica da agroecologia. Conforme explica Gomes, a agroecologia possui um enfoque social voltado à agricultura familiar e adota uma metodologia diferente da ciência agronômica convencional. Além disso, ela não se limita ao laboratório ou à parcela experimental, mas atua junto aos agricultores, por meio de processos participativos e inclusivos.
De que forma os projetos desenvolvidos abarcam o desenvolvimento sustentável?
A sustentabilidade é um conceito já um pouco desgastado. Afinal, o que queremos sustentar? Podemos sustentar uma situação de forma paternalista ou simplesmente para mantê-la como está. Por isso, tanto “desenvolvimento” quanto “sustentabilidade” já precisam de adjetivos que explicam do que se trata. Se entendermos desenvolvimento sustentável como a melhoria da qualidade de vida e do bem-viver das pessoas, aliado à manutenção da capacidade produtiva dos agroecossistemas onde elas vivem e reproduzem seu modo de vida, precisamos de tecnologias que sejam ambientalmente amigáveis. Essas tecnologias devem preservar a agro-sócio-biodiversidade e utilizar insumos que não causem danos ao meio ambiente, à fauna e à flora, como ocorre com os agrotóxicos, nem comprometam o aquífero.
Quais são as tendências emergentes em agroecologia que você percebe?
As grandes tendências emergentes da agroecologia, hoje, são trabalhar contra a apropriação indébita do conceito. No passado, o nosso grande desafio era superar o preconceito, que as pessoas diziam que isso era um conhecimento de segundo nível, que não havia base científica. Isso foi superado. Hoje, há um entendimento em amplos espaços acadêmicos, em organizações, dentro de centenas de cursos, que trata que a agroecologia é prática, é movimento e é ciência. É prática quando precisa de tecnologias que permitam qualificar o sistema de produção, é movimento porque precisa de uma sociedade organizada e é ciência porque precisa de base científica.
Como você se sente ao poder contribuir para a agroecologia através do seu trabalho?
Me sinto muito bem em poder contribuir com a agroecologia, porque nasci numa família de camponeses e tive a possibilidade de estudar. Estudei num colégio agrícola por sete anos, depois fiz agronomia na UFPel, mestrado em Extensão Rural na UFSM e doutorado na Universidade de Córdoba, e trabalho numa empresa pública de conhecimento, numa casa de ciência. Então eu tenho o dever cidadão de tentar retribuir para a sociedade aquelas oportunidades que eu tive, aquele conhecimento que eu pude adquirir, patrocinado pelo Estado, porque quando o Estado me deu a chance de estudar, de frequentar esses espaços públicos, alguma outra coisa não foi feita, porque não tem tomada de decisão nesse campo a custo zero.
E o futuro?
Eu ainda que tenho um longo percurso de trabalho na minha história, mas continuo achando que tenho como contribuir no espaço de trabalho onde eu convivo e com a minha experiência, inclusive de gestão, tentando organizar programas de formação, de qualificação, de empoderamento dos agricultores, das agricultoras, dos estudantes, em todos os níveis onde é necessário trabalhar para que a gente consiga pensar que no futuro nós podemos ter condições de viver sobre o planeta. E o ser humano vem tratando mal o planeta. Se não vermos uma estratégia de resiliência em relação ao meio ambiente e que garanta também a resiliência dos sistemas agroalimentares, estaremos colocando em risco a nossa própria segurança e soberania alimentar. E a agroecologia se preocupa com a produção de comida de qualidade, com o resgate da autoestima dos agricultores em continuação, vinculando todo o processo agroecológico com saúde dos animais, saúde das plantas, saúde da fauna, saúde dos recursos hídricos, saúde da agricultura e principalmente a saúde das pessoas.