O rio-grandino Cledenir Vergara Mendonça, 66 anos, é formado em História com especialização em Rio Grande do Sul pela Universidade Federal de Rio Grande (Furg). Tem trabalhado atualmente como escritor, com várias obras já realizadas, além de atuar na função social da Associação de Guardiões de Sementes Crioulas, em parceria com a Embrapa.
O que despertou o interesse pela carreira de historiador?
Meu avô é do interior. Eu sempre ouvia as conversas dos avós do interior, aquela simplicidade. Tem todas as histórias dele das guerras, manifestações… Mas na verdade, a curiosidade das falas começou quando eu fiz a genealogia. Eu precisava entender de onde era a minha gente. Sou Mendonça, região do Povo Novo. Eu quis entender que lugar era aquele, como se desenvolveu. A minha gente estava lá em 1778. Então, esse despertar pela história começou com as falas do meu avô, e depois eu quis entender o que era a minha família.
Do que se tratam alguns dos livros que você produziu?
O primeiro deles é um e-book. Que é a obra do “Roberto de Campos e Sua Paixão Pelas Oliveiras”, que trago as primeiras pesquisas, que foram no Rio Grande do Sul, através da extinta Fepagro, mas no campo de horticultura, que vem ser hoje o horto municipal do Povo Novo, que aliás leva o nome dele. Ele foi apaixonado pelas oliveiras. Na década de 1950, fez todo o paisagismo referente às oliveiras em Rio Grande: praças, ruas. As oliveiras eram incipientes ainda, não existia ainda uma pesquisa no Brasil. O segundo trabalho foi “Santa Isabel dos Canudos”. Santa Isabel fica em Arroio Grande, à beira do canal São Gonçalo. Hoje existem resquícios da cidade, que era emancipada de Arroio Grande e deixou de existir. Ela tinha relação com o charque, escravidão. Faço uma análise dessa ousadia de criar um município à beira do canal, que teve 11 anos de emancipação, entre 1882 e 1893. Outro, ainda, é “O Crime dos Banhados”, onde faço a análise de uma chacina que ocorreu em 1912 em Rio Grande. Toda a família foi encontrada morta, em estado de putrefação, assassinada. Faço um parâmetro com a república velha, coronelismo, os núcleos de interesse. Trago o retrato desse momento econômico, político e cultural do RS.
Como você vê a cultura de Pelotas atualmente?
Ainda pecamos na cultura popular. Há grandes movimentos das cidades, engajamento de prefeituras. Ao mesmo tempo, há uma série de fragilidades, porque a cultura popular não é tão valorizada. Ainda faltam alguns referenciais. A cultura alternativa de grupos, da questão negra, das minorias, esses espaços precisam ser reconquistados. Embora não tenha participado tanto de Pelotas, é uma cultura latente em seus princípios, origens, mas ainda prefiro uma cultura mais popular. Essa cultura grita nos bairros mais afastados dos grandes centros. Ela ruge nos movimentos dos desfavorecidos do sistema.
Como surgiu o trabalho com sementes crioulas?
As sementes crioulas nasceram quando eu fui secretário de agricultura de Rio Grande. Eu sempre lembrava do meu avô tirando as sementes de milho, abóbora e feijão, e tinha umas técnicas de fazer isso. Quando eu fui desenvolver esse programa, eu soube que tinha os guardiões de sementes crioulas na Embrapa. Fui conhecer esse processo de preservação. Firmamos uma parceria, vamos aos seminários e criamos a associação, mas com o viés da história. Eu disse: “Vocês vão cuidar do patrimônio genético e eu do social”. Atrás de cada semente e sua preservação, existem os produtores. E eu comecei a fazer pesquisas, narrar a oralidade. Temos aqui em Rio Grande 30 tipos de feijão, milhos de famílias centenárias. Formamos esse grupo para desenvolver esse trabalho de preservação de patrimônio genético e social.