A prefeitura de Pelotas e o curso de Arqueologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) deram início, no final de outubro, a um trabalho de prospecção arqueológica na Praça Coronel Pedro Osório. Sob o aval do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), as escavações acontecem no trecho dos banheiros da praça, em reforma, em uma área de 70 metros quadrados, com a abertura de 26 “quadrículas” de 50×50 centímetros e 1,30 metro de profundidade.
Na etapa atual, é realizado o processo de sondagens, e o grupo escava sem ter certeza do que vai encontrar debaixo da terra.
Durante a 51ª Feira do Livro, a comunidade pode acompanhar as atividades, que acontecem dentro do cercado no entorno dos banheiros da praça, e visitar uma exposição de peças e objetos resgatados nas intervenções.
Qual é, de fato, o trabalho de um arqueólogo?
A arqueologia não estuda dinossauros, quem estuda são os paleontólogos, que é uma área mais da biologia ou geologia. A arqueologia estuda o passado e o presente das populações humanas ao longo da história, através das coisas materiais que produzimos e que se depositou no solo. A gente lida com culturas humanas. No Brasil, por uma prática já tradicional, temos dois campos principais de arqueologia que são o estudo das populações indígenas no passado pré-colonial, e esses estudos mais de ordem urbana, que é o que a gente está fazendo, por exemplo, na praça Coronel Pedro Osório.
Como surgiu a possibilidade do trabalho atual na praça?
A praça é um sítio arqueológico, um espaço de depósito de muito material desde o século 19, então historiadores já sabem disso, já temos alguns trabalhos nesta linha, de mostrar como foi o desenvolvimento da praça desde 1832, pelo menos. Ela está passando pela quarta intervenção arqueológica. Em 2002 e 2004 foi momento de arqueologia acadêmica, para saber o que está acontecendo ali e tinha a ver com as questões do projeto Monumenta, que teve um impacto financeiro importante para a cidade de Pelotas, para o restauro dos casarões. Em 2006 já foi um trabalho mais comercial da arqueologia, em função das obras do banheiro. Então, a partir de exigência do Iphan, foi retirado dali uma coleção arqueológica gigantesca com itens do século 19 e, agora em 2025, a mesma reforma do mesmo banheiro, que vai passar por um impacto de solo, novamente houve a exigência de acompanhamento, que nós chamamos de salvamento arqueológico.
O que estão encontrando na atual intervenção?
Temos que imaginar que a praça Coronel Pedro Osório em 1832 era um campo, um terreno baldio como qualquer outro, que tinha a maioria de prédios públicos, como o Caixeral, Hotel Brasil, prefeitura, cafés. Então, as pessoas consumiam produtos importados, pois as pessoas que moravam nesse chamado segundo loteamento de Pelotas, eram pessoas com poder aquisitivo maior. Com esse contexto, estamos encontrando ali louças inglesas, garrafas de bebidas de origem inglesa, holandesa e portuguesa, então é muito material europeu e restos de animais, principalmente vacas. Particularmente nesta escavação, nós encontramos duas moedas de 1869, então é legal porque podemos datar a camada arqueológica.
Quais são as etapas?
Primeiro estamos fazendo uma escavação arqueológica concentrada em uma área específica, depois de uns 10 dias no máximo, vai ter a obra de engenharia acontecendo e aí teremos só o monitoramento disso, com uma pessoa da arqueologia monitorando a obra. Coletamos e registramos a partir dos métodos arqueológicos, vai tudo para o laboratório de arqueologia, onde fazemos o processo de curadoria, com a limpeza, catalogação, fazemos um relatório e o objeto é guardado na reserva técnica, que é a maior do sul do Estado, onde os itens são usados eventualmente em atividades educativas. O valor disso é inestimável e não é meu, não é teu, é público, é patrimônio arqueológico brasileiro.
Qual é o sentimento de fazer parte desse trabalho?
É uma prática arqueológica que não acontece todo dia. Infelizmente a gente não tem como escavar sítios arqueológicos o tempo inteiro, então quando a gente tem essas oportunidades, onde cerca de 15 alunos estão trabalhando lá comigo, ficamos todos muito felizes. Aprendemos muito colocando em prática aquilo que vemos na sala de aula. Estamos podendo falar de arqueologia em Pelotas, que é uma cidade que tem um grande potencial arqueológico, histórico e turístico, gigantesco, mas muito mal utilizado.
