No final de setembro, o governo federal abriu um crédito de R$ 12 bilhões para que produtores rurais pudessem renegociar suas dívidas ou para que possam aderir a operações de custeio e de investimento. A medida é direcionada para aqueles que tiveram as atividades prejudicadas por eventos climáticos.
Sendo a securitização das dívidas uma reivindicação dos produtores, a abertura do crédito é vista como insuficiente por produtores e especialistas no setor do agronegócio.
O advogado especialista em direito agrário, Alexandre Martini, avalia o cenário e fala sobre as ações necessárias para que os produtores possam se beneficiar da medida, mesmo que avalie insuficiente para a resolução dos problemas históricos enfrentados.
Por que a dependência de produtores rurais a pacotes emergenciais acaba sendo rotineira no Brasil?
Existe um fator que é a culpa do produtor, como a má administração e o pouco conhecimento financeiro do seu negócio. As pessoas que querem trabalhar hoje com produção rural tem que ter um controle financeiro total, tem que saber o que custa a sua produção, fazer os cálculos necessários em cima de dinheiro e não apenas de produto. Mas, a questão climática atinge diretamente porque, se colhendo bem, os produtores já estavam enfrentando dificuldades, imagina com quatro safras deficitárias? Por outro lado, o governo com essas medidas de resolução, não vai resolver o problema.
Como está a questão das dívidas dos produtores gaúchos?
Nós temos dados que as dívidas não renegociadas no Estado, que são aquelas que não entram no critério para ter acesso ao crédito, pois precisariam estar renegociadas ou inadimplentes apenas em 2025, passa de R$ 50 bilhões. As dívidas renegociadas, R$ 22 bilhões. Então, os valores que vão chegar desta nova medida do governo, não vão atender o nosso produtor. É uma medida paliativa. Para atingir todos os requisitos que estão sendo exigidos, vai ser um mínimo de produtores que vão ter acesso.
Existe cobrança exagerada nos débitos rurais?
Geralmente, os juros que são subsidiados pelo Manual de Crédito Rural são juros melhores, mais baixos e que propiciam um investimento do produtor. Porém, nestes últimos cinco anos, quando ocorre algum evento climático, o próprio manual dá o regramento para renegociar, determinando alguns requisitos, que é a cidade ter declarado calamidade. Antes o banco era obrigado a fazer a renegociação, depois passou a ser facultativo. Estamos vendo bancos exigindo juros de 12% a 15% para renegociar, já que judicializar esse processo é mais complicado ao produtor. Ele fica à mercê do banco para tentar investir em uma safra que atenda aos percentuais. Outro ponto que temos que considerar é que esses R$ 12 bilhões do governo federal serão divididos entre o Brasil todo.
Pode ser considerado que a política econômica voltada para o agro tem falhas?
Essas medidas que a gente vê chegar e em um Estado que foi, talvez, o mais atingido, e os percentuais dizem isso, a gente vê que as medidas são paliativas e a preocupação é essa. Não adianta a gente passar mais um ano ou dois remando e, no terceiro, tornar-se um caos. Nós conversamos com muitos produtores que estão querendo entender como se prepararem para uma recuperação judicial e será quando teremos problemas. Me parece que os produtores estão tentando dar a última braçada, como a gente diz, e, se não der, a situação pode complicar ainda mais. Então, deveríamos ter uma ação mais firme do governo, das coisas serem mais robustas, para realmente salvar e contornar o problema, e não apenas uma medida paliativa como estamos vendo.