O governo do PT em Pelotas encontra-se numa encruzilhada. Ou mantém as relações estremecidas com a Câmara de Vereadores ou tenta construir um ambiente mínimo de tranquilidade. A segunda opção é sempre a melhor. E ceder não significa baixar a guarda. É o caminho usual estabelecido na política brasileira. O presidente e os governadores fazem isso. Pode até dizer que a gestão é pluri, com outras bandeiras dentro dos gabinetes. Mas se sabe quem manda e quem obedece na prefeitura. E isso, aliás, os vereadores não podem mudar, pois não foram eleitos para governar.
Fernando Marroni (PT) finaliza o quinto mês com algo que nenhum outro prefeito na história recente enfrentou: a criação de um bloco parlamentar para fazer frente ao seu trabalho. O grupo dos dez pretende colocar em prática estratégias e estabelecer agendas de fiscalização por entender que o município encontra-se num cenário de falta de gestão nos serviços básicos, com apenas 10% do mandato cumprido.
Está claro que até 2028 todos os movimentos estarão sob uma lupa. Já tivemos três exemplos fortes que vieram a público: 1. As falhas na contratação emergencial do Sanep para a limpeza e desobstrução de canais, que apontaram indícios de superfaturamento no contrato sem licitação; 2. As denúncias de assédio moral encaminhadas pelo Sindicato dos Municipários de Pelotas (Simp), de uma ocupante de Cargo em Comissão (CC) contra servidores efetivos da pasta; e 3. Outra denúncia no Sanep, de um funcionário que não bateria o ponto biométrico e teria uma ficha exclusiva, sem nunca ter assinado. Todos com desdobramentos.
Surpreende a velocidade de deterioração no relacionamento entre os dois poderes. São apenas 144 dias de ações previstas para 1.460 e o clima entre as casas é péssimo. A base não consegue sustentar defesas para garantir os interesses da prefeitura e vê crescer a construção do cenário de crise institucional. Abre-se espaço para cobranças e a exposição de problemas distantes das soluções apresentadas como promessas na campanha eleitoral de 2024.
Criar um “governo paralelo” seria ridículo. Ironicamente, o próprio PT apresentou a fórmula em 1990, após a derrota de Lula para Collor nas eleições presidenciais em 1989. Ministérios fictícios fiscalizavam o governo federal e anunciavam modelos alternativos aos interessados na ideia de quem não aceitou o resultado das urnas.
A gestão Marroni parece ter dificuldade de compreender que o ano é 2025 e não mais 2004, último período do governo petista na cidade, quando a internet era discada, o Orkut chegava ao país, os orelhões somavam 1,3 milhão de aparelhos nas calçadas e três mídias tradicionais ainda ditavam as regras na comunicação. São referências que pontuam a evolução da sociedade em 20 anos e como as relações, principalmente políticas, mudaram, assim como as exigências. Não se promete mais filé e se entrega pão. Ninguém aceita. Cobra-se. A paciência deixou de ser uma virtude e tudo passou a ser para ontem. Os administradores precisam mostrar resultados e não produzir releases destacando os feitos de duas décadas atrás. É perder tempo com memórias deletadas de um passado que não teve continuidade e menosprezar as urgências do presente. Afinal, qual o plano para o município?, já questionam lideranças quando buscam as secretarias.
O Legislativo, por sua vez, aproveita-se dessas brechas e parece tomado por um desejo de poder poucas vezes visto. Trabalha no limite entre pedir e exigir, escuda-se nas prerrogativas constitucionais, como a inviolabilidade de opinião e a fiscalização incessante do Executivo, grita e quase tenta impor. Mas se a cena fugir do controle, assumirá as responsabilidades?
Diálogo só acontece quando os dois lados querem. Quem está na ponta abre conversa se caminhar em direção ao outro, e vice-versa. Aliás, ninguém em nenhuma das casas usa capa e tem perfil de super-herói. E o que menos precisamos nesse momento é de aspirante a salvador da Pátria. Precisamos de eficiência pública, transparência e paz.