“Nós jamais admitiríamos que ele fosse coagido de alguma forma”

Entrevista exclusiva

“Nós jamais admitiríamos que ele fosse coagido de alguma forma”

Jornal A Hora do Sul conversou, com exclusividade, com o piratiniense Jair Alves Pereira, advogado de defesa de Mauro Cid, personagem central da denúncia de tentativa de golpe de Estado que tem como principal nome o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)

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“Nós jamais admitiríamos que ele fosse coagido de alguma forma”
Advogado natural de Piratini estudou no Colégio Gonzaga e formou-se na UCPel. (Foto: Arquivo pessoal)

O feriado de Carnaval foi de trabalho para o advogado Jair Alves Pereira. Natural de Piratini, o ex-aluno do Colégio Gonzaga e da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) divide com os colegas César Bitencourt e Vânia Bitencourt a tarefa de defender o tenente-coronel do Exército Mauro Cid. O ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) até 2022 é o principal personagem da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra 34 pessoas por tentativa de golpe de Estado.

Pereira passou os últimos dias concentrado à frente do seu computador no caso que o Brasil e o mundo acompanham de perto, e abriu uma brecha na sua agenda para falar ao A Hora do Sul. Os principais trechos da conversa você acompanha nesta página:

Como o caso que se tornou o mais importante do Brasil chegou até vocês?

A gente tem muitos processos importantes. Na nossa carteira de clientes, acho que uns seis governadores de estado, empresários, processos da Lava Jato. A gente advoga muito em crimes contra a administração pública. Fomos procurados em Brasília, na época o Cid estava preso, pra ver se tínhamos interesse em pegar o processo. Demos uma olhada, conversamos com ele, traçamos uma estratégia que achávamos que era a única possível naquele momento. Primeiro para alinhar o processo, segundo para colocar ele em liberdade.

Nesse momento, qual a situação do Mauro Cid?

O Cid está em liberdade. No processo hoje ele é denunciado junto com o ex-presidente Bolsonaro, até porque ele era a pessoa mais próxima ao presidente. O processo segue. Ele é investigado.

O trabalho do escritório é para que ele consiga sair em liberdade ou o senhor acha difícil?

Assim… os termos do acordo, na verdade, colocam freios numa eventual condenação. A gente espera trabalhar com a absolvição. O perdão judicial é a nossa linha de defesa. Na pior das hipóteses, uma hipótese de condenação, a pena ficaria limitada a dois anos. O que já estaria hoje praticamente cumprida, porque está com cautelar.

Nesse sentido, a colaboração premiada ajuda?

Exato.

O senhor vê pontos colocados pelo STF na condução do caso que causaram algum estranhamento à defesa?

Não. Tu está falando de uma possível coação?

Sim.

Não. Nunca teve isso, coação. Vou te explicar por quê. Primeiro porque tudo foi tratado sempre pela defesa. O Mauro Cid nunca ficou sozinho com absolutamente ninguém. Quando estava preso, estava preso no Exército. Nunca ninguém falou nada sem falar conosco antes. Nunca a polícia chamou ele sem marcar a data conosco antes. Nunca. O delegado conversava com a gente o dia que a gente podia, e chamava ele. Ele nunca ficou sozinho com ninguém para a forma de ser coagido ou alguma coisa. Da mesma forma com o ministro (Alexandre de Moraes, do STF). Não teve uma audiência com o ministro e com os assessores, o juiz auxiliar dele, que a gente não estivesse presente, intimado antes.

‘Ah, mas o Alexandre de Moraes, que o pessoal comenta muito, ameaçou ele de prisão’. Não, não ameaçou ele de prisão. Disse o que tinha no processo e as consequências que teriam. Nós jamais admitiríamos que ele fosse coagido de alguma forma. Jamais, jamais, jamais. Até porque se ele tivesse sido coagido, aí realmente o acordo não valeria. Claro, é óbvio que as outras defesas vão bater nisso, porque é o argumento mais forte, eles dizerem que o Cid foi coagido. O presidente (Bolsonaro) nunca desmentiu o Cid. Desmentiu? Nunca falou: ‘Olha, o Cid tá mentindo’. Ele nunca falou. A defesa técnica vai dizer isso. Se eu estivesse do outro lado faria a mesma coisa. Bate em argumentos que tu consegue, pelo menos, criar um argumento pra ti.

O presidente sabe que tudo o que ele falou é verdade.

O senhor apresenta a defesa do Cid nesta quarta-feira. Após, quais são as próximas etapas?

Depois que todos apresentarem, o ministro deve designar uma data para o recebimento da denúncia. É onde os advogados vão fazer a sustentação oral. É a Primeira Turma (do STF), hoje o processo está na Primeira Turma e pelo que eu tenho visto deverá ser mantido para julgamento. Define se recebe a denúncia no formato apresentado pelo procurador-geral da República ou não. Então, pode receber a denúncia parcialmente, excluir alguns tipos penais, pode absolver os réus sumariamente ou pode rejeitar a denúncia. Tem várias providências que a Primeira Turma pode tomar.

A decisão em relação a ele (Cid) sai antes?

Não, todo mundo junto. Os efeitos da colaboração premiada são só no final do processo. O procurador pediu para ela ser mantida integralmente porque eles precisam dela. É importante porque faz o alinhamento da prova que tem.

O senhor considera que esse é um dos principais casos da sua vida profissional?

Em importância sim. Mas já tive processos difíceis, defendendo governador preso, bastante complexo também. Mas a relevância que tem, envolvendo um presidente da República, de uma acusação de golpe de Estado, na minha carreira é o mais importante. É um processo acompanhado mundialmente. No Brasil ele é inédito.

Qual sua ligação com Pelotas?

Minha formação é toda aí. Sou de Piratini. Meu pai tem produção pecuária. Toda minha vida, minha família é de Piratini.

O senhor é graduado por qual universidade?

Católica (UCPel). Estudei no (Colégio) Gonzaga, advoguei muito tempo em Pelotas. Minha formação jurídica toda é com José Fernando Gonzalez (advogado, professor da UFPel e ex-promotor de Justiça). Ele é a minha formação acadêmica. Fomos sócios de escritório. Aí ele parou de advogar, se aposentou e eu continuei. Tínhamos uma parceria com o Cezar Bitencourt, hoje eu sou sócio do escritório do Cezar, há muitos anos. Trabalhamos juntos, temos escritórios em Brasília e em Palmas, no Tocantins.

O senhor mantém contato com Pelotas?

Sim, muito. Eu vou e volto com muita frequência.

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